Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de fevereiro, 2023

A BALEIA (2022) Dir. Darren Aronofsky

A balela Texto de Marco Fialho O famoso barroquismo do diretor Darren Aronofsky mais uma vez é reafirmado em seu último filme, "A baleia", baseado no livro homônimo de Samuel D. Hunter e roteirizado pelo mesmo. Se em "A mãe", o diretor vinha demolindo cena a cena a casa da protagonista, aqui ele faz o mesmo, só que agora a demolição é do personagem Charlie, interpretado com o máximo de entrega possível por Brendan Fraser. O ator ganhou muito peso para fazer esse papel, em que vive um professor de redação que sofre de obesidade mórbida e dá aula on line para poder esconder a imagem. O filme se passa todo na casa de Charlie, entre a sala, o quarto e a pequena varanda da frente, além de na tela de um computador.  Até quando o diretor Aronofsky apostará todas as fichas de seus filmes nos costumeiros exageros? Em "A baleia" existem pelo menos dois. O primeiro, o próprio personagem Brendan Fraser, que além de ganhar peso ainda precisou de próteses para enfatizar

MEU NOME É CHIHIRO (2023) Dir. Rikiya Imaizumi

Nosso nome é Chihiro  Texto de Marco Fialho Todos que acompanham meus textos aqui no Cinefialho sabe o quanto é difícil ver filmes com o selo de produção Netflix me agradarem. Mas hoje preciso abrir uma exceção: "Meu nome é Chihiro", filme japonês intimista que se passa em uma pequena cidade litorânea. Somente os japoneses conseguem realizar obras como esta, marcadamente sutis, extremamente sensíveis e que batem lá no fundo da gente pelo enorme senso de humanidade que conseguem atingir. O filme é baseado numa série de mangá escrito por Hiroyuki Yasuda. A personagem da jovem Aya, que prefere ser chamada de Chihiro (Kasumi Arimura), é fascinante, ela encanta desde a primeira a cena e nossa simpatia por ela só faz crescer, tamanha beleza que ela emana. "Meu nome é Chihiro" trata diretamente de relações humanas, a jovem Chihiro possui um dom para amizades e muito do que ela aprendeu veio do ofício de acompanhante que ela exerceu durante um tempo. O filme vai nos enfilei

MATO SECO EM CHAMAS (2022) Dir. Adirley Queirós e Joana Pimenta

A poesia subversiva brotando dos corpos femininos e periféricos  Texto de Marco Fialho "Mato seco em chamas" é o novo filme distópico do cineasta Adirley Queirós, que desta vez divide a codireção com a portuguesa Joana Pimenta, fotógrafa de "Era uma vez Brasília" e também desta obra agora. A obra vem acumulando um número significativo de prêmios tanto internacionais quanto nacionais, todos a meu ver merecidos. Adirley narra uma história em que privilegia o olhar periférico e desta vez com protagonistas inteiramente femininas. Uma das diferenças significativas que reparei em "Mato seco em chamas" em comparação a seus trabalhos anteriores, é o maior engajamento político dos personagens. A maior semelhança está em continuar adotando a perspectiva dos moradores da Ceilândia (Comunidade Sol Nascente, a maior concentração populacional de Brasília), região marginalizada e bem distante do Centro de Brasília e que não está no mapa dos poderosos que a governam, a nã

MAYA (2023) Peça-filme Dir. Cavi Borges e Patrícia Niedermeier

O duplo e o ritual Maya/Patrícia Texto de Marco Fialho Se você nunca viu Patrícia Niedermeier em ação em um palco, não sabe o que está perdendo. Agora, se já viu, sabe do que eu estou a falar, então corre para ver "Maya" no saguão do Estação Net Rio. Patrícia é uma artista brilhante, sua inteireza é contagiante, inebriante para quem participa como espectador do seu estar no palco. "Maya" é antes de tudo um ritual, mas um ritual dominado pelo hibridismo de duas personagens maravilhosas, Maya Deren e Patrícia Niedermeier. É como se Patrícia tivesse encontrado sua alma gêmea no palco das representações e da arte. Não por acaso, o meu amigo e crítico Carlos Alberto Mattos, sabiamente a denominou de Patrícia Niedermaya, tamanha a entrega e cumplicidade que domina a cena do saguão do cinema.  E o local não poderia ser o mais adequado, um cinema, mas não a sala em si, mas um espaço a serviço dele, onde encontros e desencontros acontecem todos os dias. Fora da sala também r

ANDANÇA: OS ENCONTROS E AS MEMÓRIAS DE BETH CARVALHO (2022) Dir. Pedro Bronz

Foto: Ivan Klingen Beth Carvalho e a sede de transformar o Brasil Texto de Marco Fialho Quem me desculpem os streamings e os links, mas a experiência de assistir a um filme coletivamente na sala de cinema lotada e poder ouvir suspiros, choros, risos e sentir os corpos pulsando ao nosso lado não tem igual. Foi nesse clima que assisti "Andança: os encontros e as memórias de Beth Carvalho", como a um filme vivo a despertar emoções latentes em todos os presentes. Que obra estupenda esse documentário de Pedro Bronz, afora a grande personalidade que foi Beth Carvalho, que creio que qualquer filme sobre ela não conseguiria fugir, esse "Andanças..." mescla arquivos de programas de TV, depoimentos em áudio com os vídeos realizados ora pela própria Beth Carvalho ora pelo seu motorista que registravam todos as saídas as rodas de samba que ela tanto gostava de prestigiar. Logo no primeiro vídeo, no saudoso e tradicional Bip Bip, um dos sambistas já vai logo detectando: "Be

BATEM À PORTA (2022) Dir. M. Night Shyamalan

Texto de Marco Fialho O domínio do suspense com conteúdo duvidoso *Texto com muito spoiler. Aconselhável ler depois de assistir.   "Batem à porta", novo trabalho do cineasta indiano (quase norte-americano) M. Night Shyamalan reafirma o seu diferencial como diretor de tramas de suspense, embora decepcione quanto ao conteúdo. Desde o início sentimos o suspense atracando na tela. Enquanto a menina Wen, de 8 anos, brinca no aprazível jardim de uma casa alugada pelos pais em plenas férias, vemos a chegada inesperada Leonard, um estranho que puxa conversa com ela. Há uma tensão apavorante nesta cena e ela vem muito da interpretação da jovem Kristen Cui, do olhar sensível e das pausas que ela faz. O temor logo vira terror e a tensão a partir daí só aumenta. Não é de hoje que Shyamalan é um estudioso do suspense (um fã assumido de Hitchcock, inclusive nas auto-aparições), tanto que aqui todas as cenas são pensadas para a manutenção permanente da tensão de que algo de pior possa acont

TUDO EM TODO LUGAR AO MESMO TEMPO (2022) Dir. Daniel Kwan e Daniel Scheinert

A turbulência do cotidiano contemporâneo ou a realidade do metaverso? Texto de Marco Fialho "Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo", dirigido pela dupla Daniel Kwan e Daniel Scheinert, um dos favoritos ao Oscar 2023, é um filme profundamente gráfico e expositivo. Tudo o que ele quer dizer está quase o tempo todo na maneira como os diretores pensaram a sua construção imagética. E isso quer dizer o quanto ele se impõe a fórceps ao espectador, o filme nos é literalmente empurrado goela abaixo. Mas se você consegue sobreviver à velocidade dele, a sua avalanche, lá pela terceira parte tudo vai clareando e o resultado disso é você enxergar o quanto tudo nele é bem óbvio, nada complexo como se imaginava a princípio.  Reconheço em "Tudo em todo o lugar..." uma ideia bem orquestrada (essa é a palavra chave) encaixada em um roteiro mirabolante, mas inteligente, embora ao final fica-se com uma pergunta realmente válida: será que tudo isso nos leva a algum lugar ou a uma reflexão

ME BUSCO LONGE (2022) Dir. Diego Lublinsky

A resistência mora longe  Texto de Marco Fialho Desde "Elena" (2012), de Petra Costa, que virou uma febre incontida se fazer filmes a partir de sua própria família. Mais de 10 anos depois nos chega "Me Busco Longe", de Diego Lublinsky. Tal como em "Elena", esse documentário também possui a narrativa em   off   de alguém (o próprio diretor Diego Lublinsky) tentando entender o mundo a partir dos seus, aqui no caso, o objeto de estudo é Graziele, a cunhada do diretor, lésbica que vai morar na Argentina com medo do que possa ocorrer com ela depois da eleição do governo conservador e homofóbico de Bolsonaro.  As idas e vindas entre Brasil e Argentina dessa jovem são documentadas pelo diretor, numa abordagem ora muito muito próxima ora muito distante, ainda mais quando chega a pandemia do Coronavírus em 2020. O filme é interessante por mostrar e tratar muito fisicamente a nossa relação em um país dominado pela perseguição ideológica e comportamental. De alguma f

BABILÔNIA (2022) Dir. Damien Chazelle

O mundo estridente do cinema mudo       Texto de Marco Fialho "Babilônia" são três horas de alucinação que flerta permanentemente com o delirante, bem ao modo do diretor Damien Chazelle. Reconheço que tenho uma grande má vontade em relação a pelo menos dois de seus filmes, como "La La Land" (2016) e "Whiplash" (2014), em especial pelos exageros inerentes tanto na dramaturgia quanto no próprio roteiro. Mas confesso que "Babilônia" me surpreendeu positivamente. O filme se passa durante a passagem do cinema mudo para o falado, desde o final da década de 1920 até o início dos anos 1950, quando o cinema de Hollywood atingiu o apogeu. Talvez o exagero e a megalomania habituais de Chazelle se justifique no tema escolhido, pois a época inicial do cinema nos Estados Unidos nos anos 1920 a indústria ainda estava em construção e havia muito espaço para a loucura. "Babilônia" explora muito bem esse momento em que o cinema mudo começa a perder espaç

RRR (Revolta, Rebeldia e Revolução) 2022 Dir. S.S. Rajamouli

O impressionante RRR  Texto de Marco Fialho Muito bom eu poder escrever sobre "RRR" logo depois de "Pantera Negra: Wakanda para sempre", pois mostra o quanto minhas críticas à essa mega produção de Hollywood não se deu só pela magnitude de recursos financeiros ou por preconceito à narrativa, mas sim pelas escolhas cinematográficas e ideológicas desse filme. "RRR" é igualmente uma mega produção cinematográfica, não resta dúvida, com custo superior a 300 milhões de reais, a maior da história do cinema indiano (um terço a menos do que "Pantera Negra: Wakanda para sempre). O filme tem duas sub-histórias: na primeira, uma menina é sequestrada por uma riquíssima e poderosa família inglesa, por puro capricho e crueldade e o tio Bheem (N. T. Rama Rao Jr.) não mede esforços para reintegrá-la à família. Na segunda, que só descobrimos mais tarde, narra a história de um menino Raju (Ram Charan) que promete ao pai morto pelos ingleses numa guerra desigual, que arm