Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de maio, 2021

DEDO NA FERIDA (2017) Direção Silvio Tendler

As veias abertas da globalização Por Marco Fialho Olhar para o Brasil dentro de uma ótica abrangente, pensando o país na lógica do mercado financeiro mundial é o ponto de p artida deste “Dedo na ferida”, um típico documentário-tese, cujo diretor Silvio Tendler, é conhecido por realizar documentários políticos engajados, com nítidos posicionamentos ideológicos, recheados sempre por imagens históricas, com depoimentos de especialistas e agentes históricos envolvidos. Aqui ele observa os efeitos da globalização na sociedade brasileira que a cada depoimento vai desenvolvendo e alicerçando uma ideia sobre nosso desconhecimento acerca das forças que nos dominam e imobilizam. Sua abordagem meticulosa consegue mesclar habilmente elementos de sociologia, economia, política e geografia de uma só vez. Depoimentos de especialistas em análises de conjuntura política e econômica se somam aos de trabalhadores que sofrem na carne as agruras de um sistema que se estrutura para atender uma pequena elit

DEIXA QUE EU FALO (2007) Direção de Eduardo Escorel

Ser Leon Por Marco Fialho "Penso como Antonin Artaud: há dez mil modos de pertencer à vida e de lutar pela sua época"  Nise da Silveira O grande trunfo do documentário "Deixa que eu falo", de Eduardo Escorel, é o de conseguir edificar um discurso ontológico do cineasta Leon Hirszman. Com isso, o resultado é magnífico ao mostrar que a grandeza do cinema de Leon era uma extensão do homem Leon. Claro que essa afirmação pode caber em qualquer outro cineasta, embora o que pretendemos construir aqui é a integridade homem/obra. Isso quer dizer que Leon era cineasta 24 horas do dia e todas as suas ações e falas possuem inteireza e consequência. Mesmo quem não viu um filme sequer dele, cena a cena vai se apaixonando pela entrega e coerência desse cineasta/homem genial. Genial aqui significa muito, afirma o compromisso de Leon com um projeto coletivo, de um indivíduo capaz de potencializar esse coletivo.  As duas primeiras sequências do filme são bastante significativas. A pr

SANTIAGO DAS AMÉRICAS OU O OLHO DO TERCEIRO MUNDO (2019) Direção de Silvio Tendler

A força da imagem de Santiago Por Marco Fialho "Santiago das Américas ou o olho do terceiro mundo": se o título é grande, o filme também o é. O novo trabalho do incansável Silvio Tendler, nosso maior documentarista político, celebra o centenário de Santiago Álvarez, o documentarista cubano que melhor identificou e retratou a revolução cubana e mundial. É um trabalho de fôlego, mesmo que grande parte do material filmado durante vários anos foi perdido em uma crise energética em Cuba, que danificou o acervo guardado no ICAIC (Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográfica). Verdadeiramente uma pena. Porém, o mais incrível é que Tendler não deixou que isso o impedisse de realizar esse belo filme, para mim um dos mais significativos de sua longa e profícua carreira como documentarista. O filme se enquadra bem como um documentário de personagem, só que ao invés de se deter apenas na tradicional seleção e organização temporal da vida de Santiago, Silvio Tendler vai além e con

O EXERCÍCIO DO CAOS (2013) Direção de Frederico Machado

RELAÇÕES FANTASMAGÓRICAS EM UM BRASIL RECÔNDITO    Por Marco Fialho Com o lançamento do seu  primeiro longa-metragem, O Exercício do Caos , Frederico Machado se afirma como um dos grandes nomes do recente cinema autoral brasileiro, e todo esse reconhecimento não vem à revelia, foi resultado de um trabalho hercúleo e quase solitário desse realizador.  A biografia de Frederico inclusive é marcada pela coragem e amor ao cinema. De cinéfilo nos anos 80 tornou-se realizador de curtas nos anos 90, dono de locadora de vídeo e de lá para cá não parou mais. Mas o maior divisor de águas de sua carreira cinematográfica foi a criação em 2008, da Distribuidora Lume Filmes, em São Luís do Maranhão, inteiramente dedicada ao cinema de arte.  O Exercício do Caos é mais uma prova da devoção de Frederico ao cinema, um enredo cravado em um Brasil recôndito e fantasmagórico, com personagens que vivem à sombra da lei, de forma cíclica, existências à mercê de um moto contínuo social, que servem apenas para

DIVINAS DIVAS (2016) Direção Leandra Leal

Divas de ontem e de sempre Por Marco Fialho Sinopse Rogéria, Valéria, Jane Di Castro, Camille K, Fujika de Holliday, Eloína dos Leopardos, Marquesa e Brigitte de Búzios formaram, na década de 1970, o grupo que testemunhou o auge de uma Cinelândia repleta de cinemas e teatros. O documentário acompanha o reencontro das artistas para a montagem de um espetáculo, trazendo à cena as histórias e memórias de uma geração que revolucionou o comportamento sexual e desafiou a moral de uma época. A atriz Leandra Leal vem de uma família tradicional da cena teatral e televisiva brasileira. Apesar de ainda ser jovem, já conquistou prestígio, fama e reconhecimento como uma das atrizes mais importantes de sua geração. Quando anunciou o projeto “Divinas Divas” muitos devem ter se questionado se ela por trás das câmeras atingiria os mesmos resultados do que obteve à frente delas. Bem, a dúvida é respondida nesse filme de estreia, onde ela reafirma sua versatilidade artística.  As tais divas do título do

CORPO ELÉTRICO (2017) Direção de Marcelo Caetano

A resistência dos corpos alegres  Sinopse Elias (Kelner Macêdo) é assistente em uma confecção de roupas no centro de São Paulo. Ele mantém pouco contato com a família na Paraíba e passa seus dias entre os tecidos do trabalho e encontros com homens. O fim do ano traz reflexões sobre possibilidades de futuro, reconexões com o passado e muitas horas extras, que acabam por aproximá-lo dos colegas da fábrica e consequentemente inseri-lo em novos círculos de amizade e cenários. Por Marco Fialho “Corpo Elétrico” é o nome do filme, mas logo no início verificamos que também poderíamos chamá-lo de corpos elétricos, pois são eles, os corpos os maiores protagonistas dessa obra impressionante, um misto de afirmatividade e leveza. Logo na primeira cena vemos dois corpos masculinos, nus, literalmente de pernas pro ar, livremente, falando sobre as levezas da vida. Essa imagem muito define esse filme, sua força e potência. Com ele fica-se a ideia que é possível falar de diversidade sexual sem traumas,

Blu-ray Antonioni Essencial

Um Antonioni luxuoso que só! Por Marco Fialho A distribuidora "Versátil" promove um dos lançamentos mais importantes para a memória historiográfica do cinema mundial, uma edição especial em blu-ray dedicada ao mestre italiano Michelangelo Antonioni, com 3 filmes basilares para o cinema contemporâneo: "O deserto vermelho" (1964), "Blow-up - depois daquele beijo" (1966) e "O passageiro - profissão repórter" (1975). Além dos filmes estarem em cópia restauradas em alta definição, a Versátil caprichou nos extras. Dos quatro discos do box, um deles é inteiramente dedicado ao material extra de apoio. São 291 minutos de informações, entrevistas, depoimentos, trechos de documentário sobre Antonioni, making of  , fotos, trailer, entre outros. O box ainda vem com um livreto com críticas (dos críticos Raphael Cubakowic e Rafael Amaral) dedicadas aos 3 filmes, além de cartaz de cada uma das obras. Um primor, um luxo, para lá de especial, vale cada centavo inv

O CINEMA É MINHA VIDA - Direção de Cavi Borges, Patrícia Niedermeier e Rodrigo Fonseca

François Truffaut: "Os filmes da minha vida sou eu" Por Marco Fialho " La politique des Auteurs defendia sobretudo a ideia de que o homem que tem as ideias e o homem que realiza o filme deve ser o mesmo." François Truffaut. Extraído de "O cinema segundo François Truffaut" Quem acompanha o trabalho incansável de Cavi Borges (que divide a direção deste filme com Patrícia Niedermeier e Rodrigo Fonseca) pelo cinema, conhece a paixão e a luta abnegada dele em prol da sétima arte. E "O cinema é a minha vida" vem profundamente embebido desse espírito, embriagado desse sentimento contagiante para quem vivencia essa obra. "O cinema é minha vida" não escamoteia, se assume logo de cara como um filme-peça, como um desdobramento/desmembramento da peça-filme "François Truffaut: o cinema é minha vida". Em dezembro de 2019, eu tive a oportunidade de assistir e escrever sobre a peça-filme (o link para quem interessar é  https://cinefialho.blo