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Mostrando postagens de julho, 2018

VINTE ANOS - Direção de Alice de Andrade

Com açúcar e com afeto na ilha de Fidel Crítica de Marco Fialho Um dos temas mais polêmicos em discussões políticas é o que envolve Cuba. As posições extremadas costumam pautar as polêmicas. Seria Cuba uma ditadura ou um justo regime socialista? O filme "Vinte Anos", de Alice de Andrade é um caso raro nessa celeuma a céu aberto em que se transformou o debate sobre essa pequena ilha caribenha, famosa pelo açúcar, o tabaco e seus principais derivados, o rum e o charuto. Essa divisão político-ideológica vem desde os tempos em que os revolucionários bravamente comandados por Fidel, Che e Cienfuegos, em 1959, desceram a Sierra Maestra para derrubar a ditadura de Fungêncio Batista, um ditador que permitia que Cuba fosse o paraíso, ou melhor, o quintal dos grandes empresários norte-americanos. Alice de Andrade, filha de Joaquim Pedro de Andrade e formada pela famosa Escola de Cinema e TV de San Antonio de los Baños, realizou em 1992 o curta-metragem "Lua de Mel", sob

ILHA DOS CACHORROS - Direção Wes Anderson

A força estilística e política de Wes Anderson Texto de Marco Fialho Wes Anderson antes de tudo é um estilista. Seja na animação ou na live-action sua forma de ver o cinema é única e orgânica. Em "A ilha dos cachorros" não é diferente, o que prevalece é o jeito Wes Anderson de fazer cinema. A forma de movimentar a câmera paralelamente ao cenário e os enquadramentos rigorosos de Anderson pertencem a um tipo de exercício, onde a repetição tem como missão o aprimoramento de seu estilo. Mas Anderson não é tão somente isso, um artesão em busca de um certo perfeccionismo. Ele consegue sempre inserir elementos que nos movem a querer assistir seu próximo filme. Em "Ilha de cachorros" ele realiza seu filme mais político, uma metáfora interessante sobre a dominação das massas por uma elite poderosa, de como poucos conseguem implantar um regime autoritário por um convencimento manipulador, pela fabricação de embustes sociais. A técnica de animação em stop-motion de &quo

CACHORROS - Direção de Marcela Said

Cachorros debilitados não querem largar o osso Se tem uma cinematografia empenhada em não apagar o seu passado recente esta é a chilena. Ano após ano o tema que envolve a ditadura de Pinochet volta à berlinda através dos cineastas deste país. Recentemente passou ligeiro pelos nossos cinemas o ótimo "O Pacto de Adriana" (escrevi sobre este filme, ver no link https://cinefialho.blogspot.com/2018/05/o-pacto-de-adriana-direcao-de-lissette.html). O que é mais interessante ainda é observar o interesse das diretoras sobre o tema, caso de Marcela Said com seu "Cachorros". "Cachorros" pode ser vista como uma obra repleta de simbolismos e metáforas. A começar pelo próprio título, inspirado em um quadro de Guillermo Lorca, onde vemos uma menina cercada por vários cachorros. É certo que as possibilidades de leitura podem ser várias, em "Cachorros" nada é definitivamente concluso. Os cachorros aparecem em duas perspectivas no filme, a do simbolismo do

AUTO DE RESISTÊNCIA - Direção de Natasha Neri e Lula Carvalho

Pelo fim do extermínio do povo pobre, negro e jovem da periferia! Auto de resistência é o nome dado para encobrir uma ação criminosa praticada pela Polícia Militar do Rio de Janeiro. E o grande mérito desse filme é se debruçar cena a cena para mostrar o quanto essa política de segurança pública é genocida à população jovem e negra da periferia. "Auto de Resistência" tem como proposta assumir o ponto de vista dessa população que vai lenta e voluntariamente sendo exterminada pelo próprio poder público, que vê nessa população pobre algo a ser exterminada. Assim como nos anos 1970 o esquadrão da morte também o fez, mas de forma clandestina. Como não lembrar também do recente caso de Marcos Vinícius, o menino de 14 anos assassinado com um tiro nas costas pela polícia quando caminhava para mais um dia na escola? E o caso Marielle Franco, outra provavelmente assassinada por forças militares ou paramilitares e que defendia os direitos justamente dessas populações marginalizadas

CUSTÓDIA - Direção de Xavier Legrand

Crônica de uma tragédia anunciada    Por Marco Fialho  "Custódia" foi a grande surpresa do Festival Varilux de Cinema Francês de 2018. O estreante diretor Xavier Legrand assina uma direção concisa sobre um tema muitas vezes silenciado pelas famílias e sociedade, o da violência doméstica. Ao final, o que mais chama a atenção é a proposta de construção narrativa dessa obra, em especial por ela conseguir mesclar na sua tecitura momentos vigorosos de dramas, suspense e terror. O filme se divide em três partes principais: a visão jurídica, o desenrolar dessa decisão e o desfecho trágico. Esses três blocos não são exatamente equilibrados, o segundo deles (o mais extenso), onde a tensão entre os personagens é mais desenvolvida, o diretor Xavier Legrand amplia demais o arco dos personagens, deixando alguns com pouca consistência. A mãe Miriam (Léa Drucker) é um bom exemplo, seu protagonismo se esvai e a figura do pai Antoine (Denis Ménochet) e a do filho Julien

HANNAH - Direção de Andrea Pallaoro

Uma baleia encalhada na areia There's no sign of life It's just the power to charm I'm lying in the rain But I never wave bye-bye                                             David Bowie - Modern love Em "Hannah", o próprio título demarca o que o filme será. Um nome de mulher, solitário, apenas um nome solto no ar. "Hannah" é um desses filmes difíceis de assistir. Não porque há cenas de violência explícita ou de mortes terríveis, ou até mesmo de tortura explícita ou algo do gênero. O que o filme nos propõe é um acompanhar, um testemunhar de um cotidiano dessa mulher chamada Hannah. Isso, tão somente isso. Parece pouco, rotineiro ao extremo, mas não é. A cada nova cena é um acumular de pequenas tragédias, de irreconciliações dessa personagem com o mundo à sua volta. Gota a gota o nosso copo vai enchendo e vai nos afogando. Definitivamente é um filme de clima, de sufocamento da personagem e de nós espectadores. Sobre o passado pouco se esclarece.