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Mostrando postagens de junho, 2019

SANTIAGO, ITÁLIA - Direção Nanni Moretti

A falsa imparcialidade do sistema X a parcialidade consciente de Moretti  Por Marco Fialho Lá pela metade de "Santiago, Itália", o diretor Nanni Moretti aparece como entrevistador de um militar chileno preso devido à participação dele na tortura durante o período ditatorial do governo militar do presidente Augusto Pinochet (1973-1990). O militar em questão afirma que aceitou dar a entrevista porque lhe informaram que tudo ali transcorreria de forma imparcial. De pronto, o diretor Moretti o interrompe para dizer que ele não era nada imparcial, o que significava dizer que seu filme tão pouco também o era. Essa postura de Moretti como diretor pode ser apontada como a síntese desse apaixonado filme italiano inteiramente voltado para a discussão do doloroso e traumático processo histórico chileno provocado a partir da queda do Presidente Salvador Allende (1970-73), eleito democraticamente e derrubado por uma junta militar em 11 de setembro de 1973. A força desse "Santi

O PROFESSOR SUBSTITUTO - Direção de Sébastien Marnier

A visão perturbadora de Marnier sobre o mundo Existem filmes que podem ser definidos genericamente em uma única palavra, "O professor substituto" é um deles e chamá-lo de perturbador sintetiza bem os sentimentos que envolvem essa obra dirigida pelo estreante Sébastien Marnier, que cena a cena vai construindo uma atmosfera distópica ao retratar uma turma de 3º ano do ensino médio com 5 alunos CIP (Crianças Inteligentemente Precoces) de uma escola particular francesa de excelência. Pena que o título original, literalmente "A hora do lançamento" não foi utilizado também por aqui no Brasil, já que dialoga melhor com o que vemos na tela. Desde a primeira cena até a última há um quê de metafórico nessa imagem proposta pelo título original e na qual o diretor vai montando seu quebra-cabeça. A cada minuto o suspense aumenta e algo de aterrorizante vai prevalecendo na narrativa, embora tudo indicasse que veríamos apenas um filme sobre um professor substituto e seus dile

DOR E GLÓRIA - Direção de Pedro Almodóvar

Um Almodóvar cada vez mais intimista Por Marco Fialho A expectativa em torno do lançamento de um filme de Pedro Almodóvar é sempre enorme, ainda mais quando se anuncia que seu novo trabalho traz um viés autobiográfico. Seria então "Dor e glória" seu "Oito e meio"? Do ponto de vista estético seria com certeza um exagero essa comparação. Enquanto Fellini investiu em um mergulho delirante do seu cineasta em crise, Almodóvar prefere caminhar pela simples recordação. E olha que o espanhol se utilizou da heroína como mote para as recordações de seu Salvador Mallo, seu alterego nessa obra que mostra um profundo lastro emotivo. Há algo de terno nessa relação entre Almodóvar e Salvador, um visível amor próprio salvaguardado. Por mais que haja, lógico, algo de fabular na opção dramatúrgica de autoficção, vê-se claramente um Almodóvar no personagem delicadamente construído pór Antonio Banderas (não me recordo de outro papel dele mais expressivo), o que lhe valeu o p

GRAÇAS A DEUS - Direção de François Ozon

Ozon coloca o dedo na ferida católica Por Marco Fialho Em 2019, François Ozon completa 20 anos como diretor de longa-metragens e essa rica carreira com 16 filmes no currículo e obras importantes como "Sob a areia", "8 mulheres", "Swimming pool", "Dentro da casa", "Frantz" e "O amante duplo". O lugar de Ozon na filmografia francesa atual é enorme e expressiva, basta falar de seu nome para as atenções das plateias se voltarem para as telas. "Em Graças a Deus", agraciado com o Urso de Prata no Festival de Berlim,  Ozon toca em um tema social espinhoso e difícil, o da pedofilia dentro da igreja católica. O mais impactante dessa proposta cinematográfica é sua visão crítica e desenvergonhada sobre os crime praticados por padres católicos. Logo na primeira cena nos vem a informação de que trata-se de ficção baseada em fatos reais e ela é fundamental por nos precisar a existência de uma base documental presente no rot

DIAS VAZIOS - Direção de Robney Bruno Almeida

Quando as aparências sociais desmoronam Por Marco Fialho Passando quase despercebido em nossos circuitos, o ótimo "Dias vazios", filme goiano dirigido por Robney Bruno Almeida e adaptado do romance "Hoje está um dia morto" (livro premiado e revelado pelo Prêmio Sesc de literatura), de André de Leones, fala da dureza de ser jovem numa cidade do interior, onde as perspectivas de futuro são poucas e acachapantes. A crítica social é um dos grande trunfos do filme. A cada cena, Robney insere detalhes e informações que lentamente vão desenhando um castelo encantado prestes a ruir. Uma arma poderosa são os próprios jovens, personagens precisos para se construir importantes reflexões sobre o inconformismo. Robney opta por dividir a história em capítulos, opção até questionável, visto que ela não traz grandes contribuições para o todo. Mas o grande interesse do filme estão nos personagens Daniel e sua namorada Alanis. Através deles vários elementos simbólicos s

COMPRA-ME UM REVÓLVER - Direção de Julio Hernández Cordón

O México dos cartéis é aqui: a violência explícita como essência definidora de uma sociedade Por Marco Fialho A primeira imagem que me vem à cabeça ao assistir o filme mexicano "Compra-me um revólver", dirigido por Julio Henández Cordón, são os diversos documentários que já passaram eventualmente pelo Brasil em alguns festivais de cinema, onde retratam a violência atroz, de natureza inumana dos cartéis, grupos paramilitares que controlam drogas e diversos vilarejos mexicanos. Outra reflexão a ser feita a partir de "Compra-me um revólver" é sobre a nossa atual situação como país, onde vemos consternados o aumento do domínio de grupos milicianos, igualmente violentos, dispostos a resolver no tiro e na ameaça terrorista os conflitos sociais de comunidades, em sua maioria bem pobres. Esses criminosos se julgam imunes à justiça, impondo à força suas leis próprias, submetendo a todos impiedosamente uma agressividade sem limites. Uma forma de se fazer política paut