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Mostrando postagens de janeiro, 2022

BEM-VINDOS DE NOVO (2021) Direção de Marcos Yoshi

Um documento entre o íntimo e o histórico Os filmes realizados a partir das experiências familiares dos próprios diretores, onde eles fazem a narração em primeira pessoa,  já podem ser classificados como um subgênero do documentário. Apesar deles terem se proliferado, poucos realmente se sobressaíram para além de registros pessoais e muitas vezes dos seus umbigos. Talvez o mais emblemático aqui no Brasil seja o envolvente "Elena" (2012), da Petra Costa, que suscitou uma avalanche de obras que se ali se inspiraram posteriormente. O risco de levar esses projetos autorreferentes a frente são imensos, afinal, se todos os filmes carregam uma grande carga de subjetividade, imagina um baseado no registro cotidiano de sua família. Outro risco está na montagem desses filmes devido ao farto material proveniente da facilidade de estar perto do objeto filmado, ainda mais agora na era digital. Na 25ª Mostra de Cinema de Tiradentes eis que surge o documentário "Bem-vindos de novo"

SEGUINDO TODOS OS PROTOCOLOS (2021) Direção de Fábio Leal

O corpo como janela do existir Texto de Marco Fialho A Mostra de Cinema de Tiradentes se consagrou por apresentar filmes que buscam alguma dose de risco (mesmo se em algumas horas os próprios curadores queiram desfazer essa imagem já formada), um cinema que esbarra em fronteiras, tanto as de linguagem como as físicas (geográficas, geracionais, de pensamento ou de corpo), basta conferir o compêndio selecionado pelos curadores que exibe 26 longas escolhidos como representativos dos 25 anos desse evento, que tradicionalmente abre o circuito de festivais de cinema no Brasil. É nesse viés que se assiste a Tiradentes para testar os mais variados limites e para se ter algum momento de descoberta, e até de autodescoberta. Até o momento, o filme que mais chegou a esse ponto de clivagem foi "Seguindo todos os protocolos", do diretor pernambucano Fábio Leal (Reforma).  Pelo título já se pode supor que o filme de Leal aborda, ou pelo menos, é perpassado pelo tema da pandemia, mas evident

"O PROCESSO", "DOM QUIXOTE" e "SOBERBA"

Welles e a literatura como indício cinematográfico Texto de Marco Fialho "Eu baderneiro, me tornei cavaleiro malandramente, pelos caminhos. Meu companheiro, está armado até os dentes já não há mais moinhos como os de antigamente"* * trecho da letra da música "O cavaleiro e os moinhos" de João Bosco com letra de Aldir Blanc A literatura marcou a vida de Orson Welles, portanto não foi casual o fato de muitos de seus projetos se apoiarem em adaptações literárias. Também não deve ser considerado desprezível que Welles, antes de Francis Ford Coppola, tenha cogitado filmar "O coração da selva", de Joseph Conrad, para ser seu primeiro filme quando assinou contrato com a grande produtora RKO. Aqui analisaremos especificamente três adaptações literárias realizadas por Welles: "Soberba" (1942), "O processo" (1962) e o polêmico "Don Quixote" (1992), montado por Jess Franco após a morte de Welles. Os três filmes apresentam histórias e tra

"MACBETH" (1948) "OTHELLO" (1952) e "FALSTAFF" (1965)

W(elles) Shakespeare Texto de Marco Fialho Não se pode dissociar a imagem artística de Orson Welles de William Shakespeare, tão profunda foi a influência exercida pelo dramaturgo inglês na formação humana e artística do cineasta norte-americano, em especial o gosto pela ascensão e decadência de uma grande figura, seja um empresário, um rei ou um general.  Nas incursões de Welles pelo teatro, Shakespeare era um habitué. Já no cinema, Orson Welles realizou três filmes baseados nas peças do ilustre bardo inglês: "Othello", "Falstaff" e "Macbeth". Estilisticamente, "Falstaff" se diferencia bastante de "Othello" e "Macbeth", pois se caracteriza como uma comédia burlesca, já as outras duas obras como dramas com pinceladas expressionistas ditadas por uma fotografia marcadamente contrastada e por uma atuação sinistra de Welles na pele de Macbeth e outra atordoada como Othello, ambas impressionantes, a acentuar a tragédia shakespearian

"A MARCA DA MALDADE", "A DAMA DE SHANGHAI" e "O ESTRANHO"

Welles e o  noir   Texto de Marco Fialho A ousadia criativa de Orson Welles sempre esteve estampada nos filmes que realizou. Como diretor demonstrou muita versatilidade transitando por estilos e gêneros cinematográficos, mas sempre tendo o expressionismo como uma das referências mais visíveis. O noir se caracterizou inicialmente por subgênero do policial no cinema norte-americano em uma época em que os cineastas e técnicos da indústria cinematográfica (fotógrafos, cenógrafos, etc) europeia inundaram a América em franca fuga do regime nazista. O encantamento de Welles pelo cinema noir entrecortou a carreira e obras, em especial por uma atração pelas sombras intrínsecas ao estilo noir que fascinavam Welles . O que mais aproximou Welles do noir  foi o apreço pela investigação calcada nos pequenos poderes, de como eles são exercidos e vivenciados em um universo muito próximo ao submundo. Nessa vertente noir vamos discorrer sobre três obras específicas ("A marca da maldade", "