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Mostrando postagens de setembro, 2018

9° dia da Cobertura do Festival de Brasília

Fundando novos tempos: a bela mistura de Humberto Mauro com Linn da Quebrada. Cobertura por Marco Fialho O nono dia do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro foi marcado por dois documentários bem díspares entre si: Humberto Mauro, exibido na mostra, dirigido por André Di Mauro; e Bixa Travesty, da mostra competitiva, dirigido por Kiko Goifman e Cláudia Priscilla. Assistir ao filme Humberto Mauro em pleno Festival de Brasília foi uma experiência fantástica. O diretor é sobrinho-neto de Humberto Mauro e realizou uma obra inteiramente apaixonada, carregada de emoção, e esse sentimento fez com que o afetivo prevalecesse na abordagem. Há uma escolha por uma narrativa bem fluida, onde é dada prioridade a uma série de imagens dos filmes do célebre diretor mineiro entremeada com depoimentos dele mesmo. A ausência de depoimentos de conhecidos ou de pessoas que trabalharam com ele pode ser considerado um dos trunfos do filme, pois não se buscou realçar o valor de Mauro pela voz de out

8° dia da Cobertura do Festival de Brasília

A sobrepujança do discurso da imagem  em três filmes Crítica de Marco Fialho O oitavo dia do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro começou com um filme goiano, Dias vazios, dirigido por Robney Bruno Almeida, adaptado do romance Hoje está um dia morto, de André de Leones. O filme fala da dureza que é ser jovem numa cidade do interior, onde as perspectivas de futuro são poucas e acachapantes. A crítica social é um dos grande trunfos do filme. A cada cena, Robney insere detalhes e informações que lentamente vão desenhando um castelo encantado prestes a ruir. Uma arma poderosa são os próprios jovens, personagens precisos para se construir importantes reflexões sobre o inconformismo. Robney opta por dividir a história em capítulos, opção até questionável, visto que ela não traz grandes contribuições para o todo. Mas o grande interesse do filme estão nos personagens Daniel e sua namorada Alanis. Através deles vários elementos simbólicos são destilados e bem desenvolvidos. Quand

7° dia de Cobertura do Festival de Brasília

Quando a política encontra Dionísio e um operário-zumbi. No sétimo dia do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro três filmes foram vistos: Sol Alegria, da mostra Festivais do Festival; Sonâmbulos, da mostra Caleidoscópio; e A Sombra do Pai, da mostra Competitiva. Sol Alegria é daqueles filmes surpreendentes, que buscam na invenção e criatividade soluções para produção. Imerso em uma linguagem transgressora, ora teatral, ora circense, ora operística e ora musical, a trama gira em torno de uma trupe teatral familiar que guiados por um mapa sai em busca de um lugar idílico para fugir do mundo opressor, comandado por militares e pastores evangélicos. Um road movie que muito lembra a Caravana Rolidei, de Bye Bye Brasil. Inclusive, difícil não lembrar do personagem de José Wilker ao assistir Sol alegria. Alegórico e cheio de referências cinematográficas, Sol Alegria flerta com uma ambiência selvagem à moda Jodorowsky e se utiliza de citações que remetem a Glauber Rocha (Terra em Tra

6° dia - Cobertura do 51° Festival de Brasília

Corpo, decadência e metalinguagem No sexto dia do 51° Festival de Brasília do Cinema Brasileiro dois filmes foram vistos: Os Jovens Baumann, dentro da Mostra Caleidoscópio, e Ilha, da Mostra Competitiva. Em Os jovens Baumann, o forte do filme é a textura vinda da utilização de imagens em VHS. Mas a proposta experimental se restringe a esse aspecto, do ponto de vista narrativo o filme navega em mares bem conhecidos, como os de terror teen. Assim, tudo se sustenta por uma atmosfera de confraternização jovial, ameaçada sempre por algum mistério alheio aos personagens. E essa expectativa é realizada, o que de certa forma faz o filme cair no previsível. Há uma possibilidade de leitura interessante de uma metáfora que permite a análise acerca da decadência dessa família, de sua desintegração social. De qualquer maneira, Família Baumann se sustenta pelo seu ritmo agradável e leve. Um dos filmes mais aguardados do festival, Ilha, dirigido por Glenda Nicácio e Ary Rosa, fez o fechamen

5° dia da Cobertura do 51° Festival de Brasília

Os experimentais e o político: eis o quinto dia do Festival de Brasília Por Marco Fialho Dos três filmes vistos no quinto dia do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, dois dialogam com uma linguagem experimental: "Espera" e "Calipso". O primeiro exibido na mostra Festival dos festivais e o segundo na Caleidoscópio. O terceiro a completar o dia foi o documentário "Bloqueio", pertencente a mostra competitiva. A obra-prima de Cao Guimarães, "Espera" pode ser lida numa postagem inteiramente dedicada a ela. Leia no link: https://cinefialho.blogspot.com/2018/09/espera-direcao-de-cao-guimaraes.html?m=1 A outra obra que dialoga com o experimental, "Calipso", dirigida por Rodrigo Lima e Lucas Parente, possui uma proposta esteticamente ousada e de difícil comunicação com o público. Livremente inspirada no mito grego de Calipso, a deusa que vive numa ilha e seduz o valente Ulisses.  O filme é uma tentativa de atualização desse mito à

ESPERA - Direção de Cao Guimarães

O devaneio preciso de Cao Crítica escrita por Marco Fialho "Espera", dirigido por Cao Guimarães, é simplesmente uma obra de primeira grandeza, uma pérola do cinema contemporâneo, um clássico prematuro. Há uma sentença dita por Cao que muito diz sobre o seu filme: "Enquanto espero devaneio. A espera é a condição para o devaneio". O devaneio aqui mencionado é a ode sobre o tempo, uma homenagem de Cao ao bem mais precioso que o homem abriu mão. Cao, ciente disso, nos entrega um vigoroso ensaio poético sobre a espera, ou melhor, sobre o tempo e o devaneio, que nada mais representa do que a capacidade humana de fugir da rotina e voar. Cao Guimarães veio da videoarte, isto é, da consciência do hibridismo nas artes, edifica a partir dessas práticas o exercício de seus ensaios audiovisuais. Assume os processos limítrofes como próprios e como princípio do trabalho. Não casualmente ele está presente em quase todos os departamentos do filme. Limites que estão para além

4° dia da Cobertura 51° Festival de Brasília

O corpo como protagonista em Brasília No quarto dia do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro o tema político aparentemente abrandou, mas para ser mais exato, a maneira de sua expressão se deslocou agora para o corpo. Dos três filmes vistos, o corpo surge como protagonista em dois deles: Fabiana e Luna, inclusive dois nomes femininos que apontam para duas construções de identidade. O outro longa visto, O pequeno mal, dirigido por Lucas Camargo de Barros e Nicolas Thomé Zetune, que abriu a mostra paralela Caleidoscópio, inclina-se a uma vertente ficcional mais espelhada em formas de desconstrução narrativa, ou melhor, de sua fragmentação, porém não de sua total dissolução.  Um dos pontos questionáveis do filme está assentado numa necessidade dos diretores em dar um fechamento para a história. Cabe aos espectadores o papel de juntar o quebra-cabeça proposto. O que ao nosso ver enfraquece o filme, ou o que retira sua potência estetica, é o fato de que ao completar o que est

3° dia da Cobertura do 51° Festival de Brasília

A política novamente como protagonista em  - por Marco Fialho O terceiro dia do Festival de Cinema de Brasília ratificou e radicalizou mais ainda o perfil político dos filmes. O primeiro longa em exibição, Parque Oeste, dirigido por Fabiana Assis, traz a luta de uma comunidade pelo direito à moradia, acusando diretamente o Governo de Marconi Pirilo pelo massacre impingido aos moradores. Nesse filme a câmera se transforma então em arma para denunciar a agressividade e o desprezo dessa administração pelos populares. Se um governo escolhe um lado, o da especulação, a diretora também faz a sua escolha em ressaltar a luta daquele coletivo por dignidade. Logo nas primeiras cenas vemos imagens publicitárias de imóveis dos anos 1970, que mostram o quanto e quando essa ideia de indústria avassaladora se impôs com seus interesses econômicos. O filme tem como protagonista uma mulher ativista, casada com outro ativista que foi assassinado pela polícia do Estado de Goiás. Parque Oeste é desdobramen

2° dia da Cobertura do 51° Festival de Brasília

Vivendo a história e a política no 51° Festival de Brasília - Por Marco Fialho O segundo dia do festival de Brasília (15/10) mostrou que esse ano o clima será mais para acalorado do que para calmaria. Três longas foram vistos hoje. O público dá indicios de que participará politicamente de forma efusiva. Parece que a efervescência eleitoral tomou conta de vez e reverbera nas reações aos filmes. A própria curadoria do festival optou em resoar o momento político e promoveu escolhas incisivas e em consonância com os anseios vindos da plateia. A maior prova desse magnetismo foi a exibição do primeiro longa da mostra competitiva, o filme Torre das Donzelas, que arrancou muitos aplausos durante a projeção e palmas consagratórias ao final, em especial quando a diretora Susanna Lira expôs os rostos das 30 entrevistadas que passaram pela prisão e tortura no Presídio Tiradentes (SP) durante o período de exceção durante a ditadura civil-militar iniciada em abril de 1964. E toda a comoção da

BENZINHO - Direção de Gustavo Pizzi

Critica escrita por Marco Fialho Quando o afeto do cotidiano encontra a realização estética.  "Benzinho" faz parte de uma estirpe de filmes que celebra a vida em sua plenitude. Faz parte ainda de outra estirpe de filme recente, a que busca reconstituir um cotidiano familiar tipicamente brasileiro e contemporâneo. Uma família qualquer, nada especial em sua constituição, uma que facilmente reconhecemos como vizinha nossa ou de algum parente, ou até mesmo a nossa. No cinema brasileiro do século 21, essa é uma temática recorrente, bem recorrente aliás. Filmes como "Casa Grande", "Que Horas Ela Volta?", "Aquarius" e "Como os Nossos Pais" são exemplos exponenciais desse cinema que parte do cotidiano para radiografar algo que está além dele, o país. Entretanto ao situar "Benzinho" nesse espectro de filmes, uma ressalva vale a pena de ser feita. Ele se configura como o mais interessante, o mais bem urdido desse conjunto de o