Texto por Marco Fialho
Verão na Sicília, dirigido por Marguerita Spampinato, é antes de tudo um filme carismático e leve, embora trate de temas agudos e existenciais. A trama se resume a Nico (Marco Fiore), um garoto por volta de 8 anos que entra de férias escolares e a sua babá não poderá cuidar dele, pois precisa viajar para casar, e ele é obrigado a passar um mês na casa de uma tia solteirona (Aurora Quattrocchio) na afastada Ilha da Sicília.
Interessante como os tempos se cruzam no decorrer da narrativa de Verão na Sicília. O tempo ralentado da tradição siciliana ditado pela personagem da tia solteirona, com suas imagens desgastadas de Cristo, se confronta com a vivacidade urbana de Nico, um menino espevitado criado no norte da Itália, numa ambiência ditada pela tecnologia contemporânea, cujo o celular é o maior símbolo dessas diferenças de ritmo de vida.
Mas o melhor de Verão na Sicília é o quanto o filme vai além desses contrastes, o quanto ele mostra que a vida é permanentemente dinâmica e imprevisível em seu tempo ininterrupto. É maravilhoso como a diretora Marguerita Spampinato constrói uma mise-en-scène fluida e elegante. Não há espalhafato nem grandes surpresas no campo técnico, tudo está a serviço de uma narrativa onde os atores estão condicionados pelo ambiente rústico da Sicília.
É nesse delicado contraste que as cenas vão se edificando e nos prendendo a cada plano filmado. Tudo aqui se equilibra por meio de um carinho com que cada personagem é abraçado pelas interpretações afetuosas e verdadeiras. A câmera gravita com elegância, como se não precisasse se esforçar em capturar a essência do que está sendo filmado. Os olhares de cada um diz tanto e até o cão Frank parece ter entendido a organicidade das cenas, tal como ele se integra quando está de frente para as câmeras. O filme ganha um ar mais terno ainda, depois que Nico descobre por trás da rudeza da tia, existe fatos românticos e traumáticos em seu passado, em que preconceitos não permitiram que ela vivesse momentos mais felizes.
Marguerita Spampinato sabe temperar a trama principal da relação entre tia e sobrinho com a participação das crianças do local, especialmente Rosa (Camille Dugay), que logo estabelece uma ligação profunda pelas trocas sedutoras de olhares. Mas ainda tem as senhoras, que reafirmam o lugar da tradição católica da Sicília e os hábitos culturais muito específicos, como as sardinhas fritas e as berinjelas empanadas. Não há, por parte da direção, uma procura por estabelecer quem está certo ou errado nos conflitos culturais entre o norte e o sul da Itália. Ao invés disso, se estabelece uma troca, um entendimento entre as diferenças, por mais que isso seja por meio de estranhamentos e aprendizados mais duros.
O afeto e a sensibilidade de Nico é bem visível desde a cena inicial, onde a sua babá Violeta lhe conta uma bela história da relação entre um menino e o mar. A ternura e a delicadeza está posta desde esse instante e nos prepara para o tom que o filme assumirá a partir de então. É encantador como Verão na Sicília se passa no presente, mas guarda algo de nostálgico nele, como se fosse uma memória de uma infância perdida no tempo e isso instaura uma atmosfera poética. E convenhamos, poesia, delicadeza, ternura e sensibilidade nunca é demais.

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