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MOSTRA CINEBH 2023


CineBH vem aí mostrando novos diretores da América Latina

Texto de Marco Fialho

É a primeira vez que o CineFialho irá cobrir no modo presencial a Mostra CineBH, evento organizado pela Universo Produção. Também, por coincidência é a primeira vez que a mostra terá inserido um formato competitivo. Nessa matéria falaremos um pouco da programação da mostra, de como a curadoria coordenada pelo experiente Cleber Eduardo, montou a grade final extensa com 93 filmes a serem exibidos em 8 espaços de Belo Horizonte, em apenas 6 dias (26 de setembro a 1º de outubro). O que atraiu o CineFialho a encarar essa cobertura foi o ineditismo da grande maioria dos filmes e a oportunidade mais do rara, única mesmo, de conhecer uma produção independente realizada em países da América Latina como Chile, Colômbia, México, Peru, Paraguai, Cuba e Argentina, sem esquecer lógico do Brasil. 

Lemos com atenção toda a programação ofertada e vamos para BH cientes da responsabilidade de que vamos assistir a obras diferenciadas, que não estão disponíveis no mercado e que dificilmente estarão em algum momento dado ao perfil atual do circuito exibidor brasileiro. Festivais de cinema têm essa mágica, de garimpar produções audaciosas, muitas vezes primeiros trabalhos de realizadores que se expressam com afinco e garra. Os filmes se organizarão em 13 mostras específicas, mas o CineBH tem uma temática central a balizar todas as mostras, chamada "Territórios da(s) Latinidade(s)", por isso, a mostra competitiva, composta por 8 longas se chama Território. 

Há uma organicidade temática por onde a questão do território perpassa as diversas obras. Dentro da "Mostra Território" apenas um filme é brasileiro "Toda noite estarei lá", de Tati Franklin e Suellen Vasconcelos. Os outros sete filmes são: "Guapo'y" (Paraguai/Catar); "Otro sol" (Chile/Bélgica /França); "Moto" (Argentina); "Llamadas desde Moscu" (Cuba); "A la sombra de la luz" (Chile); "Diógenes" (Peru); "Puentes Del mar" (Colômbia). Como diz o Coordenador Curatorial Cléber Eduardo, "são filmes avessos a estereótipos de latinidades genéricas e expressivos das múltiplas possibilidades de se atentar a um território concreto, local antes de nacional, e não deixar as pressões pelas justas representações asfixiar as autoralidades". A curadoria dessa mostra também é dividida com Ester Fer e Leonardo Amaral. Essas premissas curatoriais só nos enchem de esperança em relação a potência desses filmes. 

Outra mostra bem interessante é a Continente. Foram selecionados 14 filmes para compor essa mostra, em que se destacam o enfoque de gênero, identidade, ocupações, experiências e faixas etárias, tendo sempre contextos histórico-social como guia. Os filmes vem de países como México, Argentina, Chile, Colômbia, além do Brasil que entra com o forte "Propriedade", de Daniel Bandeira e "Amanhã", de Marcos Pimentel. Para os que tem mais disposição, tem "A viagem do ônibus amarelo", o novo filme do genial Julio Bressane, com 7 horas e 10 minutos de duração.

Os homenageados do CineBH são dois mineiros: Rafael Conde e a versátil Yara de Novaes. Os filmes a serem exibidos são: "Samba-canção", "A hora vagabunda", "Françoise", "Fronteira", "Rua da amargura", "A chuva nos telhados antigos", "Depois a louca sou eu" e o longa de abertura da Mostra CineBH, "Zé" (2023), mais recente filme dirigido pelo Rafael Conde. Outra mostra que não deixa de ser homenagem, é a 'Diálogos históricos", um importante tributo ao dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, que traz os filmes "Prata Palomares" (1970), "O Rei da vela" (1982) e "Fedro" (2021). Já a Mostra CineMundi, com curadoria do crítico de cinema Pedro Butcher, destaca três obras fundamentais lançadas recentemente pelo programa CineMundi: "Mato Seco em Chamas", de Adirley Queirós e Joana Pimenta; "Paterno", de Marcelo Lordello; e "Tia Virgínia", de Fábio Meira. 

Além dessas mostras todas já descritas aqui, tem a tradicional Mostra Praça, onde em plena Praça Liberdade serão exibidos filmes de curta-metragens e os consagrados longas "Lô Borges - toda essa água", de Rodrigo Oliveira; e o cultuado documentário carioca, "Andança - Encontros e memórias de Beth Carvalho", de Pedro Bronz. A Mostra CineBH exibe ainda uma mostra de curtas, com curadoria de Tatiana Carvalho Costa e Marcelo Miranda, além da seleção de filme infantis para as escolas e público geral. 

Essa Mostra CineBH, conforme vocês podem ver, promete ser muito interessante, repleta de filmes autorais vindos de vários países da América Latina. Acredito que esse enfoque torne a mostra fundamental dentro do cenário brasileiro, na medida em que o Festival de Gramado abriu mão dos filmes vindos desses países vizinhos. Outro ponto positivo é que todas as sessões da Mostra CineBH são gratuitas, em espaços de exibição bem centralizados no contexto geográfico da cidade. Uma mostra que promete promover a autoralidade, a diversidade e a discussão política e estética da América Latina. O CineFialho estará lá presencialmente cobrindo essa maravilha de proposta curatorial que já está mais do que desenhada.                              

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