Texto por Marco Fialho
Pequenas Coisas Como Estas é um bom exemplo de uma obra que quer discutir uma questão social importante, mas que o faz a partir das exploração psicológica de um personagem, no caso de Bill Furlong (Cillian Murphy), um homem introspectivo com um passado traumático cujo presente está prestes a lhe lançar um desafio.
Contudo, Pequenas Coisas Como Estas surpreende positivamente, e muito, pela narrativa contida, pelos pequenos gestos e por uma fotografia que sabe aquecer o coração e manter na alma uma textura seca. A atuação de Cillian Murphy se destaca pela extrema sensibilidade na composição desse personagem conturbado, que vive com uma mancha do passado pairando sobre a sua existência. Ele trabalha numa firma que fornece carvão e assim precisa ir no convento para fazer entregas.
Pequenas Coisas Como Estas se constrói sem pressa, explorando os silêncios e os tempos mais longos que propiciam as reflexões de Bill. Tim Mielants trabalha uma crítica ácida e frontal à tradição católica irlandesa ao desnudar as relações hipócritas capitaneadas pela madre superiora, interpretada com uma pitada maligna pela grande atriz Emily Watson, que faz uma ótima participação como contrapeso do personagem de Cillian Murphy.
É por demais interessante como Tim Mielants amarra o passado de Bill Furlong ao presente, quando o entregador se depara como uma menina grávida submetida a um processo de tortura por parte da instituição religiosa. Aos poucos, vamos conhecendo o terror instaurado pela madre superiora para as internas, quase sempre colocadas no internato por estarem com uma gravidez precoce ou por serem indisciplinadas no seio familiar.
Mas é Cillian Murphy o responsável por manter o espectador mais atento à narrativa, com sua interpretação cativante, precisa e muito atenta aos conflitos do passado de Bill Furlong. A fotografia também constrói um mundo de sombras, em especial nas cenas noturnas em que Bill se encontra com sua consciência de que não pode mais aceitar passivamente as imposições que a vida continuamente lhe fez. As cenas com a esposa, também se revelam importantes para revelar aspectos e detalhes da personalidade e caráter de Bill. O filme não deixa de ser um estudo sobre as relações de poder entre as classes e como as pessoas se utilizam de suas posições sociais para subjugar as outras e sempre manter a atmosfera hipócrita.
A câmera muitas vezes nos levam vagarosamente para as memórias de Bill, cuja personalidade vai acumulando pacientemente fatos do passado e do presente. O ritmo de Pequenas Coisas Como Estas dialoga diretamente com a maneira como Bill encara a vida, como ele a assimila, por isso, vários closes são executados para que possamos ler os pensamentos e as dúvidas de Bill. Esse é um filme de câmera, daqueles cuja pretensão parece pequena, embora tenha o poder de transferir as angústias do personagem para o público, sendo esse mecanismo um artifício difícil de alcançar, mas que Tim Mielants mostra capricho narrativo suficiente para cumprir a dura tarefa.
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