Pular para o conteúdo principal

MARIA CALLAS (2024) Dir. Pablo Larraín


Texto por Carmela Fialho e Marco Fialho

O filme Maria Callas é uma cinebiografia que tem como protagonista Angelina Jolie. A opção do diretor Pablo Larraín foi construir uma narrativa a partir da última semana de vida da famosa soprano greco-americana, que arrebatou fãs para as suas apresentações de ópera pelo mundo. A escolha em retratar a personagem no final de sua vida traz algumas questões que merecem destaque como a perda da sua potente voz, a dependência a medicamentos e momentos de alucinações.  

A interpretação de Angelina Jolie oscila entre a postura de uma diva arrogante, que desconta no seu mordomo os traumas da perda da voz e consequentemente da sua fama, e uma mulher depressiva cheia de angústias e lembranças dolorosas, principalmente do fracassado relacionamento com o milionário grego Aristóteles Onassis. O foco principal do filme recai mais nesse desastroso relacionamento, como se Maria Callas nunca tivesse sido feliz. Os momentos de glamour ficaram reservados apenas às apresentações das famosas óperas, que Angelina Jolie dubla com competência.

O caminho escolhido pelo diretor chileno Pablo Larraín na construção da personagem retira boa parte da sua potência artística ao priorizar somente as questões existenciais do final dramático e traumático da vida de Maria Callas. Na maioria das vezes prefere enfocar em suas angústias através de lembranças misturadas com alucinações e pouco aborda o seu talento e a época áurea de seu sucesso, que foi estrondoso. 

Vale registrar inclusive, a duvidosa abertura de Maria Callas. Larraín realiza como um preâmbulo, um videoclipe criado por ele para retratar Callas como uma diva do passado, tanto que enquanto ouvimos uma ópera de Verdi, interpretada por ela, vemos imagens trabalhadas artificialmente com texturas para dar a impressão de envelhecimento, de Callas vivendo o esplendor da carreira em iates, viagens e espetáculos grandiosos. Constrói-se aqui uma visão de um glamour de outrora, sendo que não será isso que será visto no decorrer de Maria Callas.     

O apartamento luxuoso que serve de cenário, apenas acentua um caráter decadente da cantora, que se mostra sempre indecisa e sem forças. Angelina Jolie edifica uma Callas superficial, repleta de trejeitos, com caras e bocas, como se fosse uma simples dondoca mimada, quando Callas foi uma força da natureza. Larraín preferiu imprimir um tom sensacionalista à sua história, apelando para o romance da diva com Onassis, como estivesse filmando para um revista de fofocas. 

A maneira como Maria Callas edificou a sua carreira não é abordada no filme, o que fragiliza por demais a personagem. Saímos do cinema com a sensação de que o diretor não conseguiu dar conta da complexidade dessa mulher de personalidade forte que construiu uma sólida carreira artística. O diretor salienta em sua narrativa um discurso em que só enxerga essa mulher a partir de suas fragilidades. O que Larraín queria com seu filme? Mostrar que até grandes artistas podem decair, já que Callas perdeu a capacidade de cantar? Mas qual seria o propósito de filmar Callas apenas nesse momento sombrio e de angústia? E o que dizer do filme começar e terminar com o corpo de Callas no chão do apartamento?  

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

GODZILLA - MINUS ONE

Texto de Marco Fialho O maior mérito de "Godzilla - Minus One" está na maneira como o diretor Takeshi Yamazaki conjuga a história narrada com o contexto histórico do Japão pós segunda guerra. O monstro Godzilla é fruto direto do efeito nuclear provocado pela bomba atômica lançada pelos Estados Unidos.  O filme funciona como uma resposta à vergonha japonesa ao difícil processo de reconstrução do país, como algo ainda a ser superado internamente pela população. A partir desse fato, há um hábil manejo no roteiro para que a história funcione a contento, com uma boa fluência narrativa.  Aqui o monstro é revelado desde o início, não havendo nenhuma valorização narrativa, ou mistério, sobre a sua aparição. Mas se repararmos com atenção, "Godzilla - Minus One" é  um filme de monstro, embora se sustente tendo na base um melodrama de dar inveja até aos mais radicais da safra mexicana dos anos 1950. A história parte de Koichi, um piloto kamikaze que se recusa a executar uma or...

BANDIDA: A NÚMERO UM

Texto de Marco Fialho Logo que inicia o filme Bandida: A Número Um , a primeira impressão que tive foi a de que vinha mais um "favela movie " para conta do cinema brasileiro. Mas depois de transcorrido mais de uma hora de filme, a sensação continuou a mesma. Sim, Bandida: A Número Um é desnecessariamente mais uma obra defasada realizada na terceira década do Século XXI, um filme com cara de vinte anos atrás, e não precisava, pois a história em si poderia ter buscado caminhos narrativos mais criativos e originais, afinal, não é todo dia que temos à disposição um roteiro calcado na história de uma mulher poderosa no mundo do crime.     O diretor João Wainer realiza seu filme a partir do livro A Número Um, de Raquel de Oliveira, em que a autora narra a sua própria história como a primeira dama do tráfico no Morro do Vidigal. A ex-BBB Maria Bomani interpreta muito bem essa mulher forte que conseguiu se impor com inteligência e força perante uma conjuntura do crime inteir...

ÁLBUM DE FILMES VISTOS EM 2024

Nesta página do CineFialho, o leitor encontra todos os filmes vistos no decorrer de 2024, com cotação, um pequeno comentário ou o link para a crítica do filme. 212) A FLOR DE BURITI (2024) Dir. João Salaviza e Renée Nader Messora COTAÇÃO: 9 Crítica:  A FLOR DE BURITI (2024) Dir. João Salaviza e Renée Nader Messora (cinefialho.blogspot.com) __________ 211) SALAMANDRA (2024) Dir. Alex Carvalho COTAÇÃO: 3 Crítica:  SALAMANDRA (2024) Dir. Alex Carvalho (cinefialho.blogspot.com) __________ 210) UM LUGAR SILENCIOSO: DIA UM COTAÇÃO: 6 Crítica:  UM LUGAR SILENCIOSO: DIA UM (2024) Dir. Michael Sarnoski (cinefialho.blogspot.com) __________ 209) CASA IZABEL (2024) Dir. Gil Barone COTAÇÃO: 6 Crítica:  CASA IZABEL (2022) Dir. Gil Barone (cinefialho.blogspot.com) __________ 208) TESTAMENTO (2024) Dir. Denys Arcand  COTAÇÃO: 7 Crítica:  TESTAMENTO (2024) Dir. Denys Arcand (cinefialho.blogspot.com) __________ 207) BANDIDA: A NÚMERO UM (2024) Dir. João Wainer COTAÇÃO: 4 Crí...