Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal, da diretora Raven Jackson, narra poeticamente a vida de Mack (Kaylee Nicole Johnson), uma menina e mulher negra que viveu e cresceu às margens do Rio Mississipi. Nota-se desde a primeira cena, o talento fotográfico de Raven, esse que é um ofício no qual a diretora possui um lastro como profissional. Esse é o seu primeiro filme como diretora e ao que tudo indica, retrata algo muito pessoal e orgânico.
O filme me remeteu muito a um álbum de fotografias, com o seu um quê de nostalgia e solidão. Os planos são longos de modo a estender a dimensão temporal das cenas. Há ainda um visível elemento cíclico onde a água (da chuva e do rio) e a terra (as estradas e o barro) estão não só presentes como se tornam recorrentes durante toda a trama.
A diretora Raven Jackson opta por um caminho muito mais sensorial para contar a sua história do que construir cenas muito explicativas, os tempos se embaralham, a trama alterna entre passados e presente, sempre tendo Mack como o elo que permite o espectador se reconectar com essas temporalidades. A ideia de ancestralidade paira pelo filme, com imagens da avó e da mãe que nos lembram sempre o quanto essa personagem é formada pelas águas e a terra de Mississipi.
Em Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal, o tom intimista prevalece sobre uma história a ser contada com muitos detalhes. Ficamos mais com as impressões de Mack, seu amor por Wood, que perpassa a infância, se expande pela juventude e lhe deixa uma filha para criar. Inclusive, a câmera de Raven Jackson parece sempre se desviar de Wood, seu rosto está como ele, fugidio. Há um esteio de vidas femininas e o olhar de Raven é sobretudo para essas personagens, como a irmã de Mack, sua avó e mãe. O maior personagem masculino é o do pai.
Como o filme se pauta muito numa ideia de ciclo vindo da natureza, há cenas, como a primeira, onde o pai ensina Mack a pescar e a mãe a cortar o peixe. Raven Jackson mostra Mack como uma menina muito sensível, conectada com a natureza que a cerca e a brinda com momentos especiais, mesmo quando parecem os mais corriqueiros, como o ato de apreciar uma chuva com a filha lhe falando sobre a benção que são as águas ou do prazer de comer uma pedra de barro com a irmã.
Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal tem momentos muito bonitos, bem fotografados, com um som que consegue captar o mundo ao invés de inserir músicas que poderiam sugestionar algum sentido ou sentimento. Só senti falta de mais fatos que dariam mais consistência e corpo à história. Mas o filme não deixa de ser uma bela viagem sensorial à trajetória de Mack, onde os sorrisos e as lágrimas estão presentes igual medida e o título não deixa de evocar as lágrimas. Eu diria que essa é uma obra para se deixar imergir e se permitir contemplar pelos poros da pele.
Comentários
Postar um comentário
Deixe seu comentário. Quero saber o que você achou do meu texto. Obrigado!