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BLACK RIO! BLACK POWER! (2024) Dir. Emilio Domingos


Texto por Marco Fialho 

Em Black Rio! Black Power!, o diretor Emilio Domingos reafirma o compromisso do seu cinema com a cultura negra periférica ao por como tema central desse documentário o papel social e cultural dos bailes black, em especial os do subúrbio carioca. Depois de A Batalha do Passinho (2012), Deixa na Régua (2016) e Favela É Moda (2020), agora Emilio adentra no universo dos bailes de soul music dos subúrbios cariocas.  
 
A primeira cena até sugere a formação de um baile nostálgico, quando vemos desembarcar de um caminhão estacionado em frente ao Grêmio Social Esportivo Rocha Miranda, um poderoso arsenal de caixas de som. Mas logo somos dissuadidos dessa ideia inicial, já que as mesmas apenas servem para formar o fundo do cenário onde os diversos personagens vão dar os seus depoimentos ao diretor.
 
O que mais me impressionou em Black Rio! Black Power! foi a força e a densidade dos depoimentos, todos penetrantes e contagiantes, embora a repetição dos enquadramentos das entrevistas cansem no último terço do filme. A predominância das entrevistas sobre a pesquisa de imagem é gritante, mas devemos reconhecer a contundência das falas, em especial a de Dom Filó, sem dúvida, o grande protagonista de Black Rio! Black Power!.
 
O documentário de Emilio Domingos explora bem a trajetória cultural, mas não esquece o alcance político que o movimento Black teve na sociedade brasileira. O diretor Emilio Domingos, por sua vez, sublinha papel de Dom Filó como fundamental para a autoestima dos frequentadores dos bailes, que ouviam seus discursos insistentes que enaltecida a filosofia Black is Beautiflul. 
 
Senti falta de um maior número de dança, que era um dos grandes atrativos dos bailes. Apenas no final do filme vemos uns passos de alguns entrevistados e uns passos rápidos sempre fugidios durante a projeção. Mas do ponto de vista do roteiro em si, Black Rio! Black Power! dá conta da complexidade do tema, inclusive ao levantar a discussão sobre a música Black do período como sendo um fenômeno da alienação da juventude. 
 
Dentre os entrevistados, vemos os depoimentos de músicos, como Carlos Dafé e o sambista Marquinhos de Oswaldo Cruz, dançarinos, dançarinas e donos das equipes de som, aqui tendo Dom Filó como um grande nome. Por meio dos depoimentos, Emilio Domingos constrói uma narrativa temporal, que vai costurando o tema. A visão final que fica é o da importância dos bailes como acontecimentos de congregação e conscientização das problemáticas sociais dos negros, historicamente relegados aos espaços suburbanos da cidade, mas que souberam em paralelo edificar uma estética e um movimento de resistência, afinal, Black is Beautiful.

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