Texto de Marco Fialho
Não seria exagero dizer que "Softie" é um filme em que o jovem ator Aliocha Reinert, que interpreta o menino Johnny, carrega o filme nas costas. Não há uma cena em que ele não esteja presente e essa presença é algo realmente imponente. A impressão que temos é que Aliocha compreendeu as minúcias desse personagem complexo e repleto de camadas.
É de louvar como o diretor Samuel Theis introduz a temática LGBT em "Softie", com o máximo de delicadeza. Muito aos poucos, a temática vai sendo inserido, sempre com uma sutileza que precisa ser destacada. O diretor guarda para uma única cena, o extravasamento dos sentimentos amorosos de Johnny. Tudo é muito cuidadoso, pois o terreno é sinuoso e a derrapagem pode ocorrer com a devida facilidade.
O personagem do professor é outro muito bem delineado por Samuel Theis. A todo o instante ele tem uma preocupação para não ser mal interpretado, caso do filme dinamarquês "A Caça", dirigido por Thomaz Vinterberg, onde um professor é acusado de pedofilia. É nesse fio tênue e cortante que o diretor caminha, mas demonstrando uma enorme capacidade de saber que o terreno não é nada fácil de ser percorrido.
A câmera de Samuel Theis chama a atenção por registrar muitas cenas em close de Johnny, como se o diretor quisesse reafirmar plano a plano o protagonismo de Johnny. E o diretor não se furta em colocar a câmera na mão em algumas cenas para mostrar a movimentação do personagem em diversas ocasiões. A câmera se enamora de Johnny, mas a recíproca é totalmente verdadeira, pois Aliocha Reinert demonstra uma total cumplicidade na composição de Johnny. A força desse ator em cena merece destaques dos críticos e prêmios nos festivais que participa. Tem planos marcantes, como o que Johnny briga com a família numa mesa de jantar. Quanta força cênica esse jovem ator consegue concentrar numa única tomada.
Há ainda em "Softie" um amplo registro sobre diversas questões sociais que o filme aborda. A ausência paterna é uma delas e talvez o que levou Johnny a se apaixonar pelo seu competente professor. Mas evidente que o próprio corpo aqui se faz um precioso personagem. Johnny tira a blusa para seduzir o professor, deita no sofá para oferecer o seu corpo. A sequência é difícil por trazer a erotização de um menino de 10 anos em franco processo de autodescoberta. A relação com a mãe também é bastante complicada, já que ela abusa dele como mão-de-obra gratuita para cuidar da irmã menor, o que o atrapalha nos estudos, fora a ajuda que dá quando a mãe extrapola na bebida.
"Softie" merece uma atenção cuidadosa, por ser um filme potente e ao mesmo tempo doce sobre um menino que encara a autodescoberta do seu corpo. Mas o escopo dramático de Johnny talvez seja a maior conquista do filme. Ver um Johnny como um personagem corajoso é recompensador. Como é impactante a cena em que ele comunica à mãe que vai estudar em um internato. A calma com que ele faz isso é de uma beleza sem tamanho. Quem menino, que homem é esse jovem que sabe o que quer para o seu futuro, que sabe desenhar, sem medo, o destino que traçou para si.
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