Texto de Marco Fialho
"O desafio de Marguerite" invade o fechado e desconhecido mundo dos matemáticos para falar de uma jovem talentosa, a Marguerite do título, que tem como meta de vida resolver equações complexas e aparentemente insolúveis de matemática, como a conjectura de Goldbach.
O filme é dirigido pela Anna Novion que narra a história se utilizando de técnicas narrativas clássicas do cinema para abordar um tema nada convencional das ciências matemáticas. Seguindo esses preceitos clássicos, todo o arco dramático desenhado parte da exposição do tema, passa pelos obstáculos vividos pela protagonista (que tem suas teses questionadas pela banca de doutorado) e a sua luta para vencer tanto as dificuldades impostas pelo cotidiano acadêmico quanto pela própria matemática até atingir o sucesso na matemática e no amor.
Marguerite é construída como uma personagem difícil de se relacionar, circunspecta em demasia, sua vida é toda dedicada à matemática, o que lhe causa problemas na hora de se relacionar com professores, colegas e no amor. A chegada de um colega Lucas, outro jovem matemático também interessado nas perspectivas de estudo mais desafiadores e ambicioso como acadêmico. A diretora desenvolve as histórias e os conflitos do filme em torno da personalidade ambígua de Marguerite, por um lado acanhada e desajeitada, do outro resoluta no estudo sobre a matemática. Marguerite é a própria representação da matemática, faz da objetividade a matéria-prima da sua maneira de viver a vida.
Na segunda metade do filme, a história gira praticamente em torno do encontro de Marguerite com o jovem e igualmente talentoso Lucas, suas birras, alianças e do inevitável amor entre dois personagens completamente apaixonados pela matemática. A partir desse ponto, o filme torna-se bastante previsível, e vai tomando forma de um tipo de comédia romântica americana típica dos anos 1990, protagonizadas pela Meg Ryan (como "Lente do amor", "Teoria do amor", "Mensagem para você", "Sintonia de amor" e "Harry Sally", este de 1989), onde o drama se mistura com um romance entre personagens.
Esqueci de mencionar, que no meio do caminho tem a colocatária, Noa, uma bela dançarina negra na qual divide um quarto. Ela funciona como um exemplo para Marguerite, uma mulher independente que sabe curtir os prazeres da vida. Essa parte, em que Noa está ao lado de Marguerite é a mais interessante, a que expande o filme para uma Paris féerica, noturna e cheia de energia, justamente o que falta mais a Marguerite, sentir a vida fora da matemática. Esse é o pulo do ato para que ela se solte mais e possa voltar à matemática com mais experiência de vida, de jogos clandestinos como o Mahjong... e de sexo, claro.
Por mais que "O desafio de Marguerite" tenha uma fotografia expressiva, onde os pontos de luz estão sempre competindo com as da sombra e isso é importante para se entender os contornos psicológicos ambíguos de Marguerite, a narrativa clássica e por demais linear não permite grandes surpresas para o espectador, que sai do cinema tal como entrou. A falta de espaço para que o espectador possa interrogar o filme de alguma maneira me incomoda, pois o que queremos é ir ao cinema para sermos provocados e os filmes podem nos incomodar de diferentes formas, seja na narrativa proposta ou na mensagem. Mas quando nos deparamos com o óbvio e nada nos impacta, a força do que vimos se esvai no acender das luzes do cinema. Assim vamos tomar aquela cerveja depois do filme para falar de qualquer coisa, menos do próprio filme.
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