Pornochanchada: entre a liberalidade e o conservadorismo
Texto de Marco Fialho
Quase sempre, os documentários possuem um laço afetivo entre o realizador e o objeto de seu filme a ser retratado. Em "O país da pornochanchada" não é diferente. Adolfo Lachtermacher é filho de Saul Lachtermacher (1926-1982), um dos cineastas que fez carreira dirigindo nos anos 1970 e no início dos anos 1980, algumas pornochanchadas. O dispositivo utilizado por Adolfo é o de encontrar a cópia perdida de um filme do pai. Bem diferente da proposta, relativamente recente, do documentário de Fernanda Pessoa, "Histórias que o nosso cinema (não) contava", lançado em 2018, que sem narração em off, tentava dar sentido a esse grupo de filmes apenas costurando na montagem cenas significativas e expressivas de diversas obras da pornochanchada.
Outro dado que torna o filme interessante é a abordagem histórica que o diretor encampa para desenvolver o enredo, em especial a ênfase que é conferida aos hábitos e costumes do período pesquisado. O machismo, o feminismo, a emancipação feminina e a urbanização da sociedade são alguns temas que merecem atenção dos diretor. "O país da pornochanchada" não pretende fazer um inventário da pornochanchada, mas antes, busca entender como era a sociedade de onde emergiu esse tipo de cinema tão característico em nossa cultura dos anos 1970. E nesse viés o filme torna-se bem interrogativo quando salienta o quanto o cinema tratou a imagem de maneira bastante artificial, beirando até o ridículo, ao enfatizar cenas de personagens na praia feitas em estúdios, assim como uma outra do paraíso construído com pedaços pintados de isopor.
Há em "O país da pornochanchada" uma tendência a tornar tudo muito digerível e leve, embora o diretor consiga delinear o contexto histórico da ditadura militar em sua abordagem do período, inclusive apontando a pornochanchada como um momento de respiro e suavidade dentro de um regime de exceção que vivíamos. Adolfo vai até mais longe, volta mais ainda no tempo para discutir à própria época da chanchada (na qual o seu pai se iniciou na carreira do cinema), da comédia como dispositivo para rir de si mesmo e o quanto a pornochanchada também resgatou esse aspecto tão popular em nosso cinema. A pornochanchada chama para si o lado paródico, mas igualmente não esquece de incorporar a metalinguagem, ao brincar, e novamente rir, com a enorme dificuldade de se fazer cinema no Brasil. Algumas cenas são realmente engraçadas.
A partir dessa procura, Adolfo decide ampliar sua investigação, no intuito de tentar entender a própria história do país a partir do cinema e das transformações nas quais o país passou na segunda metade do século XX, época em que seu pai dirigiu vários filmes, a maioria pornochanchadas. Uma das características mais marcantes desse documentário é a da narração ser conduzida pelo próprio diretor, que tenta a todo instante inserir pitacos cômicos na história, mas há, curiosamente, diversas imagens de arquivos interessantes a evocar a sociedade dos anos 1970. Me chamou atenção uma sequência desconcertante, quando a câmera de Adolfo Lachtermacher adentra em um antigo cinema, agora dominado por uma igreja evangélica e na narração, o diretor cita a contraditória relação entre um passado profano do cinema e um presente marcado pelo uso de um suposto "sagrado" da religião.
Outro dado que torna o filme interessante é a abordagem histórica que o diretor encampa para desenvolver o enredo, em especial a ênfase que é conferida aos hábitos e costumes do período pesquisado. O machismo, o feminismo, a emancipação feminina e a urbanização da sociedade são alguns temas que merecem atenção dos diretor. "O país da pornochanchada" não pretende fazer um inventário da pornochanchada, mas antes, busca entender como era a sociedade de onde emergiu esse tipo de cinema tão característico em nossa cultura dos anos 1970. E nesse viés o filme torna-se bem interrogativo quando salienta o quanto o cinema tratou a imagem de maneira bastante artificial, beirando até o ridículo, ao enfatizar cenas de personagens na praia feitas em estúdios, assim como uma outra do paraíso construído com pedaços pintados de isopor.
Se a crítica via a pornochanchada como algo leviano e vazio intelectualmente, o fato era que esses filmes atraiam o público, ávido por viver uma sexualidade que antes não era permitida de se ver nos cinemas. Se, por um lado, isso sinalizou uma maior liberalidade dos costumes, por outro, Adolfo questiona que os filmes ao mesmo tempo sublinhavam o velho machismo de sempre de nossa sociedade, embora o pesquisador Hernani Heffner defenda que o filme dava as mulheres a última palavra de consentimento. Em vários momentos, Adolfo Lachtermacher tenta suavizar a erotização dos filmes, afirmando que eles não mostravam tanto quanto prometiam na maioria das vezes os seus ousados cartazes e títulos, que eram, na verdade, os aspecto mais pesados de todo o contexto cinematográfico das pornochanchadas, que contavam histórias na maioria das vezes leves e ingênuas.
Há em "O país da pornochanchada" uma tendência a tornar tudo muito digerível e leve, embora o diretor consiga delinear o contexto histórico da ditadura militar em sua abordagem do período, inclusive apontando a pornochanchada como um momento de respiro e suavidade dentro de um regime de exceção que vivíamos. Adolfo vai até mais longe, volta mais ainda no tempo para discutir à própria época da chanchada (na qual o seu pai se iniciou na carreira do cinema), da comédia como dispositivo para rir de si mesmo e o quanto a pornochanchada também resgatou esse aspecto tão popular em nosso cinema. A pornochanchada chama para si o lado paródico, mas igualmente não esquece de incorporar a metalinguagem, ao brincar, e novamente rir, com a enorme dificuldade de se fazer cinema no Brasil. Algumas cenas são realmente engraçadas.
"O país da pornochanchada" presta ainda uma homenagem aos atores e atrizes que serviram como grandes promotores dos filmes. Assim, vemos passar pela tela nomes como o de Jorge Dória, Ney Latorraca, Maria Lúcia Dahl, Grande Otelo, Sandra Barsotti e Flavio Migliaccio, apenas para citar alguns. Adolfo não busca coletar muitas entrevistas para o filme, prefere ele mesmo ir costurando com seus comentários na maioria das vezes descontraídos e por ora cômicos, o painel dessa sociedade em transformação, de um Brasil que muda aqui e ali para no fundo permanecer o mesmo, um país que consegue propagar a liberalidade sexual sem abrir mão do suas raízes conservadoras e puritanas.
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