Texto por Marco Fialho
Por trás da aparente superficialidade de Cloud - Nuvem de Vingança, novo filme de Kiyoshi Kurosawa, se esconde uma visão cinematográfica muito cruel acerca do mundo capitalista contemporâneo. A começar pelo título, que faz uma clara alusão às nuvens, lugar responsável pelo etéreo no mundo ilimitado proporcionado pela tecnologia. A palavra cloud também pode se associar ao aspecto sombrio do mundo, que aqui igualmente faz bastante sentido.
Kiyoshi abandona as suas famosas análises familiares para adentrar na vida de Yoshii (Masaki Suda) um jovem que trabalha numa fábrica, mas que nas horas vagas revende produtos na internet. O sucesso do rapaz leva ele a pedir demissão, mesmo com o seu chefe o seduzir com contínuas propostas de promoções. Yoshii se junta com Akiko (Kotone Furukawa), sua namorada e vai viver em um bairro no meio do mato, bem afastado de Tóquio. Logo, começa a ser perseguido por intrigas inventadas por colega que quer se associar a ele para um grande negócio, tendo o seu inconformado ex-chefe na fábrica como outro inimigo em potencial.
O mais interessante em Cloud - Nuvem de Vingança é como Kiyoshi Kurosawa arquiteta a trama, começando como se tudo transcorresse em um ambiente tomado pela normalidade, numa vida organizada pelo trabalho e pelo relacionamento amoroso. De repente, o diretor dá uma guinada e leva a narrativa para outro lugar ao instaurar um clima de suspense e terror na história desse rapaz que apenas queria ganhar o seu dinheiro com as revendas de produtos. Kurosawa transforma o filme em uma parábola sobre essa sociedade que só pensa em enriquecer, mesmo que essa riqueza fique sempre impalpável e nas nuvens.
Se inicialmente Cloud - Nuvem de Vingança sugeria um drama de um jovem em busca de estabilidade financeira, logo depois a trama vira um inferno onde a sobrevivência fala mais alto. A fotografia de Yasuyuki Sasaki acompanha o processo de virada desse mundo de promessas para um mundo que beira o apocalíptico. Os tons mais sombrios prevalecem e as cores mais vivas ficam ausentes na trama, ao máximo aparecendo no figurino de Akiko, onde o vermelho deixa no ar se a intenção é a paixão ou o sangue.
Kiyoshi Kurosawa também introduz elementos de faroeste na trama, com o surgimento de Sano (Daiken Okudaira), um assistente que se torna um tipo de anjo da guarda de Yoshii. Os duelos armados ainda evocam abertamente uma mise-en-scène do faroeste inserida dentro da história de suspense e terror que o filme encampa como a principal linha narrativa. A própria nuvem das armas, pode ser mais uma metáfora que o título implicitamente carrega.
O maior mérito de Kurosawa em sua proposta narrativa é a de tornar sua obra algo nitidamente paródica, onde a realidade fica a todo momento em paralelo, perambulando e contornando os rumos extremados que a história assume. Em Cloud - Nuvem de Vingança, Kurosawa constrói com sagacidade e competência perfis bem delineados, que representam bem a ganância social devidamente incrustada em cada um deles, inclusive em Akiko. Para quem quer pensar o papel animalesco do dinheiro nesse mundo onde a violência se impõe socialmente, esse é um filme bem propício para se fazer essa análise.
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