Texto por Marco Fialho
É sempre uma ótima notícia saber do lançamento de um novo documentário sobre Andy Warhol. Sua personalidade incomum e diversa possibilita abordagens ricas e plurais. O diretor L' ubomír Ján Slivka se esforça por dar uma panorâmica da vida e da carreira desse grande artista, que ultrapassou as fronteiras do que habitualmente se entende de arte. Esse é o maior desafio dessa obra, dar conta de tantos detalhes que envolveram a vida conturbada de Warhol.
Para cumprir a ousada meta planejada, o diretor buscou depoimentos inéditos de parentes, estudiosos e amigos do artista. Se esse é o maior trunfo da direção é talvez igualmente a sua maior fraqueza. Durante quase duas horas não ouvimos uma só vez a voz de Warhol, o que é frustrante, o que atesta o estranho viés de sua personalidade, claramente reclusa e avessa a dar entrevistas e depoimentos. Mas não deixa de ser esquisito acessar Warhol pelas vozes de outros, e essas vozes soam realmente excessivas e praticamente contradizem a própria ideia de Warhol de não se deixar ser interpretado.
Mas a admiração do diretor L' ubomír é evidente em cada nova cena. O artista é visto no documentário em sua complexidade e aparentes contradições. Elementos como a religiosidade de Warhol possui uma abordagem interessante ao ajudar na própria visão artística e estilística de sua obra, como as repetições de imagens em painéis à maioria das vezes coloridos e o apego às imagens icônicas.
Mais do que a infância, L' ubomír quer compreender a herança cultural de suas origens eslavas da região da Rutênia, em especial a religião greco-católico específico de uma localidade chamada Miková. Esses aspectos são muito importantes para a compreensão da personalidade de Warhol, que perde o pai, o único provedor da família aos 14 anos.
L' ubomír centra muito sua narrativa nos depoimentos, mas não deixa de ilustrar o filme com muitas imagens de desenhos e obras de Warhol, além de muitas fotos do próprio artista, o que enriquece bastante o resultado das falas que são o principal veio narrativo utilizado. Na maior parte de Andy Warhol - Um Sonho Americano vemos uma ênfase nas origens da carreira de Warhol, em que ele modelou a sua forma de desenhar e apreender um mundo onde as mudanças eram mais céleres do que nunca.
O filme vai então mostrando como Warhol se adaptou ao mundo e suas diversas demandas. Começou desenhando como ilustrador para marcas, mas logo trilhou para o desenho artístico e às artes plásticas, incorporando a ideia de consumo ao seu estilo que depois ficou inconfundível dentro da Pop Art. É nesse momento que Warhol se aproxima dos ícones do cinema para retratá-los em suas obras. Marlon Brando, Elvis foram alvos fáceis, mas foi com Marilyn Monroe que encontrou a imagem perfeita para as suas ideias artísticas e para a consagração.
O documentário também esmiúça bastante a criação da Factory, o famoso estúdio de Warhol, onde ele pode dedicar boa parte de sua vida a produzir muitas das obras controversas e polêmicas que realizou, como uma série dedicada à cadeira elétrica, forma questionável utilizada pelo governo para disciplinar à sociedade. Andy Warhol - Um Sonho Americano aborda o artista e sua relação com as drogas e a vida louca que levava regada à festas, muitas delas filmadas pelo próprio Warhol.
O interesse de Warhol pelo cinema se intensifica e L' ubomír explora bem esse universo do artista, que jamais pensou o cinema como algo comercial, mas sim como um experimento artístico permanente. O cinema para Warhol era fundamental, para ele expressava uma ideia muito precisa: de que a vida devia ser dirigida como um filme, tudo para ele partia de uma ideia criativa, a vida devia espelhar isso. Há uma artificialidade nessa ideia, assim como algo que necessitava de um enorme consumo de energia vital. O diretor mostra como Warhol foi uma pessoa obsessiva e sabia exatamente o que queria, mesmo que suas ideias parecessem exóticas para os outros. A ideia de caos passa então a fazer parte do escopo de sua criação artística.
O documentário bate muito na tecla do quanto Warhol atraía a atenção de outros artistas, não só das artes plásticas como do cinema e da música. Assim, promoveu bandas como The Velvet Underground & Nico, cuja capa do álbum contou com uma arte dele, uma banana colorida em um fundo branco. Foi Warhol que juntou Nico à banda afirmando que eles precisavam ter de uma cantora bonita para os shows. O filme ainda traz a tentativa de assassinato que o artista sofreu no elevador da Factory e as penosas consequências para a sua saúde no futuro.
Se Andy Warhol - Um Sonho Americano parte de pressupostos bem convencionais para elaborar sua narrativa, é impossível não se envolver com as narrativas warholianas, suas incansáveis maneiras de traduzir o caos nova-iorquino e a vida louca provocada pelo consumismo capitalista que ele tão bem incorporou e sintetizou. O filme de L' ubomír mostra o quanto à personalidade de Warhol será crucial para melhor entender o mundo cada vez mais acelerado que vivemos.
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