Texto por Marco Fialho e Carmela Fialho
O diretor Jaume Collet-Serra realiza um interessante filme de terror, onde a sua maior motivação é o drama da protagonista Ramona (Danielle Deadwyler), uma mulher que perdeu o marido (Russell Hornsby) em um acidente de carro do qual também estava presente, e que sofre um tipo de transtorno mental, tendo alucinações e visões que comprometem a sua visão sobre os fatos que ocorrem ao seu redor.
O filme acerta em desenvolver mais as sensações da protagonista do que se prender somente em fatos explicativos. Sem saber, mergulhamos no inconsciente de Ramona e na confusão mental em que ela vive após um violento trauma. É importante frisar que a fruição do espectador é condicionada a partir do ponto de vista de Ramona, o que justifica o embaralhamento da história e as incoerências temporal e espacial presentes na narrativa.
O elemento sobrenatural aparece no filme logo no início, com uma mulher vestida de preto (Okwui Okpokwasili) e com o rosto coberto, sentada no jardim sem que os personagens ou nós saibamos de quem se trata tal pessoa. Esse é um mistério que passa a pairar e algo que desperta medo e incômodo. O fantasmagórico toma conta da trama, na medida que essa estranha entidade começa a afrontar tanto Ramona quanto seus filhos Taylor (Peyton Jackson) e Annie (Estella Kahiha), que precisam lidar com essa presença nebulosa.
Alguns elementos simbólicos são descortinados na história, como a casa que fica em um lugar afastado do Centro e onde a trama se desenvolve. A casa está sem luz, outro aspecto simbólico importante para o desenvolvimento dos conflitos e do isolamento, não só territorial como também psíquico de Ramona. A trama se constrói intercalada com algumas cenas e flashes do passado que atordoam os três personagens e a casa vai surgindo como um projeto de fuga de Ramona e do marido da vida conturbada das grandes cidades.
Interessante observar que estamos acompanhando uma história de uma família negra que busca harmonia, embora não haja nenhum aprofundamento em relação a essa questão, se eles foram morar numa região mais afastada para fugir de alguma agressão racista ou algo parecido. Não lembra, por exemplo, as discussões feitas nos filmes Corra (2017), Nós (2019) ou Não! Não Olhe! (2022), de Jordan Peele, quando a questão racista são bem evidentes nas tramas. Mas justamente é esse outro caminho que Jaume Collet-Serra toma que torna o filme atrativo, por buscar discursos próprios para contar sua sombria história.
Mais à frente, descobrimos que havia um conflito entre Ramona e o marido, pois ela argumentava que não estava feliz na casa, mesmo que ela pudesse ser aquela que normalmente se diz que é a dos sonhos: grande, confortável e com um quintal. Desde a primeira cena que a relação entre o casal já aparece como algo central e como perturbação à saúde mental de Ramona, que se sente oprimida pelas tarefas de dona de casa numa relação no casamento em que ela está insatisfeita com a sua posição.
Ainda que a mise-en-scène de A Mulher no Jardim não traga grandes novidades para o gênero terror e não consiga aprofundar a discussão sobre saúde mental na contemporaneidade, ela consegue prender a atenção com os enigmas não revelados até a metade da trama. Aos poucos a personalidade em crise de Ramona vai sendo revelada e a tensão se acumula. Vários portais mentais de Ramona são abertos, com imagens que ficam entre as lembranças com o marido e as fantasias delirantes e macabras. A parte simbólica inerente à trama evidenciam os melhores momentos da obra.
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