Texto por Marco Fialho
É sempre fundamental falar e discutir as ditaduras que proliferaram na América do Sul dos anos 1950 em diante, e que deixaram marcas profundas na sociedade e política ainda hoje nesses países. Sob as Bandeiras, o Sol, dirigido pela cineasta Juanjo Pereira investe no tema enfocando a longa ditadura do General Alfredo Stroessner no Paraguai (1959-89), embora careça de criatividade, especialmente na montagem do filme.
Um mérito inconteste do filme é o debruçar na pesquisa de materiais raros, já que a ditadura de Stroessner destruiu muitos dos vestígios das imagens que pudessem comprometer o seu regime de exceção. Muitas das informações do documentário são partilhadas por legendas que contextualizam as imagens. Juanjo Pereira abriu mão de se ter uma narrativa em voz over, que nesse caso específico, ajudaria a dar um dinamismo maior ou até mesmo questionar as imagens oficiais.
Essas imagens oficiais são a maioria oriundas de propagandas do governo, que exaltavam a ideologia patriótica inerente ao discurso e as ações demagógicas do Partido Colorado, que até hoje domina o país. às vezes é cansativo assistir as imagens produzidas pelo governo, como discursos em comícios, inaugurações pomposas e formaturas militares.
Os discursos oficiais valorizavam uma versão clean do regime, enquanto nas ruas, a oposição era violentamente reprimida e as prisões se amontoavam de presos e grassava a prática da tortura. A democracia paraguaia era visivelmente algo fake, em especial depois que Stroessner modificou a constituição para poder se eleger indefinidamente. Obras grandiosas, como a da Usina de Itaipu, realizada em parceria com a ditadura brasileira, escamoteavam a dureza da ditadura e servia para vender uma imagem de sucesso e grandes investimentos na infraestrutura do país. O regime também fez vista grossa para a imensa agressão ambiental que a usina ocasionou nos animais e flora do local, que morreram ou foram deslocados para outras regiões.
A cereja do bolo do Governo de Stroessner é o acolhimento que dá ao condenado médico nazista Josef Mengele, recebido com louros pelo ditador paraguaio. O maior ardil da história do Paraguai é a destituição de Stroessner por um "golpe militar" dado pelo seu genro, para que a ditadura continuasse a vigorar no país.
O filme de Juanjo Pereira registra na sua parte final, as imagens de arquivo da oposição abrindo os lugares de guarda dos diversos materiais que comprovavam as mortes, torturas e desaparecimento de milhares de paraguaios durante o regime de Stroessner. Calcula-se que mais de 20.000 pessoas morreram ao fazer oposição ao governo ditatorial. Mas o que mais deixa todos estarrecidos é a informação de que ninguém jamais foi julgado pelos crimes, tão pouco o ditador Stroessner. O documentário poderia ir mais além, porque conforme ele é montado, fica apenas como um registro de um momento terrível, mas sem a devida reflexão sobre quais são as marcas dessa ditadura para o Paraguai de hoje.
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