Texto por Marco Fialho
Depois da explosão de Sex, o primeiro filme da trilogia de Dag Johan Haugerud sobre os relacionamentos dos noruegueses na contemporaneidade, Love soa formalmente leve em demasia aos olhos do espectador. A crueza dos diálogos do primeiro não encontra continuidade nesse drama romântico, com ares de compaixão e solidariedade.
Os personagens principais são dois. Um deles é a médica Marianne (Andrea Braein Hovig) e o outro é o enfermeiro Tor (Toyo Cittadella Jacobsen). Ainda tem uma terceira, uma trabalhadora da cultura, Heidi (Marte Engebrigtsen), que Dag Johan deixa meio de lado no decorrer da trama e pouco sabemos de seus relacionamentos. Marianne é uma mulher que representa bem o feminino do nosso tempo, independente, convicta de sua solteirice e livre para o sexo, pelo menos até conhecer o geólogo Ole Harald (Thomas Gullestad), um homem desquitado em busca de um terceiro casamento. Já Tor é um homem que busca mais sexo do que amor nas relações com outros homens, prioritariamente arrumadas no aplicativo de relacionamentos do Tinder.
Tor está perto do 40, e Marianne, chegando aos 50. Ambos prezam por suas liberdades amorosas e sem maiores compromissos. O filme oscila entre mostrar essas relações fugazes mas colocando em contraponto laços afetivos mais consistentes e duradouros para esses personagens. Tor se envolve com Bjorg (Lars Jacob Holm), um homem que conhece numa das travessias de balsa que fazia diariamente tanto para trabalhar quanto para buscar algo para fazer em seu tempo livre. Bjorg é um homem reservado, de poucas palavras e deveras desconfiado, que fica ainda mais casmurro quando descobre que tem câncer de próstata. Já Marianne flerta com Ole, que mora perto da ex-esposa para continuar participando da educação das duas filhas desse segundo casamento.
Como Marianne e Tor trabalham no mesmo hospital, o filme expõe alguns casos de pacientes que possuem câncer de próstata e a difícil tarefa para os homens em perder uma importante parte de seu corpo, ligado ao prazer (mais ainda nas relações entre homens) e a ereção masculina. Os resultados chocantes que assistimos durante o filme, inclusive na primeira cena, em que um paciente está sendo filmado em plano próximo e com a câmera fixa recebendo a dura notícia dada por Marianne de sua doença. Mais uma vez, Dag Johan Haugerud não é levado pelo tom melodramático ao retratar com razoável secura as relações, priorizando sempre os planos fixos durante todo o filme. Se compararmos Sex com Love, o segundo mantém uma frieza, entretanto a dureza que há no primeiro nem chega perto do segundo, que passa como uma narrativa bem mais empática e sem grande radicalidade formal ou de roteiro.
A personagem de Heidi chega a realçar em seu trabalho alguns aspectos da sexualidade contemporânea, quando descreve os significados das obras de arte públicas, como a que homenageia a importância das mulheres em Oslo e outras que refletem sobre relacionamentos não padronizados socialmente, como o casamento gay ou o amor livre. Assim, algumas formas de relacionamentos vão sendo apresentadas, enquanto os personagens põem em prática várias dessas representações amorosas.
O diretor Dag Johan Haugerud se esforça por modernizar as ideias e práticas amorosas de uma Oslo desenvolvida economicamente, mas ao fim creio que as concepções amorosas em busca de uma estabilidade conjugal são as que predominam para os dois protagonistas. Mesmo que uma das relações seja entre dois homens, o diretor não escapa do convencional em amarrar os dois personagens numa ideia de casamento, que era o que o filme buscava questionar, inclusive classificando o Tinder como um tipo de bordel gratuito. Creio que essa visão seja simplificadora e não dá conta da complexidade das relações na sociedade capitalista e consumista, que empurrou a humanidade para a solidão e o distanciamento entre as pessoas, que mesmo morando tão próximas continuam sem se comunicar com profundidade. Os encontros sexuais são tão fugazes que mal dá tempo de se perguntar o nome de pessoas que acabaram de se relacionar. É o famoso sexo sem intimidade. Love infelizmente, não adentra solidamente nessa discussão. Vamos ver se Dreams resgata a vibração e a originalidade de Sex, levando a trilogia novamente para o caminho da audácia do primeiro filme.
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