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INVERNO À LUZ DA LUA (2019) Dir. Dae Hyung Lim


Texto por Marco Fialho

A delicadeza é um dos principais traços de Inverno à Luz da Lua, drama singelo que trata de tabus e interdições familiares. O mais interessante é como o diretor Dae Hyung Lim trabalha o tema sem expô-lo de maneira direta, mas até certo ponto mantendo o mistério da trama. 

Tudo é narrado como se os pontos centrais do filme fossem voltados para as duas famílias que aparecem no enredo, a de Yoon-Hee (Kim Hee-Ae) e a de Jun (Yuko Nakamura). O filme ainda transita entre a Coreia do Sul e o Japão, pois a família de Jun, apesar de coreana mora no Japão. Yoon-Hee, é separada do marido e vive em companhia da filha Sae-Bom (Kim So-Hye).

Sae-Bom é a filha de Yoon-Hee que inconformada com a infelicidade estrutural da mãe, lê uma carta de uma antiga amiga (no caso, Jun) que não fala há 20 anos e planeja uma viagem ao Japão para tentar entender quem é essa mulher misteriosa. O diretor Dae Hyung Lim investe nos personagens, os desenvolve a contento, com sensibilidade, e envolvendo cada um com sentimento e verdade. 

O mais incrível de Inverno à Luz da Lua é como o conservadorismo da sociedade torna-se lentamente o grande personagem do filme. Por trás da leveza que Dae Hyung Lim veste a sua história, tem um peso descomunal que as duas amigas, Yoon-Hee e Jun carregam consigo. A narrativa lenta sustentada pela direção, permite que o espectador mergulhe nos dramas do presente e do passado dos personagens. 

A construção do tempo de Inverno à Luz da Lua é fundamental para o acompanhamento da história, já que o filme perpassa os 20 anos da vida dos personagens, mesmo que o diretor não faça uso direto de flashbacks na narrativa. A carta de Jun para Yoon-Hee vai sendo lida no transcurso do filme. Com as informações que ouvimos da carta, costuramos o tempo.

Um amor, para lá de proibido, se desenha com força e com amargor, pois o reencontro é cercado pelo tempo não vivido e que levou cada vida para um lado, inclusive para países diferentes. O mais interessante é como Dae Hyung Lim mostra como a vida pode até separar os corpos, mas o amor, mesmo assim permanecerá vivo à revelia das sanções impostas pela sociedade.               

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