Texto por Marco Fialho
O Sol Por Testemunha é um thriller tomado pelo requinte visual e uma narrativa envolvente, com a presença eletrizante do astro Alain Delon como o vigarista Tom Ripley, em um de seus grandes papéis no cinema, como um protagonista que conduz a atenção da câmera e do espectador a cada cena. Aliás, essa foi a obra que o consagrou como símbolo de beleza e sedução.
O filme de Clément é de certo modo simbólico, representa uma sociopatia e um tipo de ideal de riqueza, da conquista de um desejo de ser um homem que apenas consiga viver o lado bom da vida. O Sol Por Testemunha também trabalha uma oposição entre uma América próspera e uma Europa decadente, mas símbolo do refinamento com suas praias e roupas de luxo, suas grifes imponentes.
É curioso ver Alain Delon, um francês, incorporar um personagem americano, não deixa de ser um chiste, pois a história de Ripley brinca com um desejo dos Estados Unidos serem a nova Europa. Vale lembrar o quanto a Europa simbolizava a sofisticação e havia essa rixa entre a ex-Colónia rica e a tradição cultural europeia, um dos berços da humanidade ocidental.
Logo no começo, vemos o jovem Tom Ripley chegando dos Estados Unidos à Europa, a mando do rico pai de Philippe Greenleaf (Maurice Ronet) para capturar o filho bon vivant. Não deixa de ser um conto sobre um americano seduzido pelas belezas das terras europeias. A história baseada no famoso livro de Patricia Highsmith, é perfeito para discutir essa geração que viveu para usufruir da grana construída pelo pai e o encanto dos novos ricos americanos pelo glamour europeu. Hoje, em pleno século XXI, essa discussão pode parecer ultrapassada, já que atualmente vivemos um declínio da ideia de vida do sonho americano e já sabemos onde isso deu: numa nova onda, só que agora de decadência americana.
A fotografia de Henri Dacaë é suntuosa ao explorar os ambientes externos e internos desse mundo sofisticado dos personagens. Além disso, Decaë sabe valorizar os vários planos dos personagens, com closes reveladores e sedutores de cada um dos interpretes.
O diretor René Clément pensa o filme como um conto de ambição, esperteza e de frustração. A primeira parte vemos a relação entre Greenfeat, a namorada Marge (Marie Laforêt) e Ripley, a tentativa deste último de estar sempre perto do rico Greenfeat, esperando o momento para dar o bote certo. A segunda parte é a de Ripley se livrando do amigo rico e assumindo sua identidade. A Terceira, e última parte, é a tentativa de Ripley empurrar o dinheiro para Marge e se aproximar dela como Ripley, seduzi-la e compartilhar assim o seu dinheiro.
Entretanto, diz-se que crime perfeito não existe e a tese maior de O Sol Por Testemunha é essa, perpetrada por um moralismo de que o crime não compensa. A vida é feita de surpresas e fatos inesperados, não havendo a total garantia do sucesso, por mais que um determinado plano seja aparentemente impecável. Em todo caso, fica marcada a frieza de Ripley como uma possibilidade irônica de se viver a vida às custas dos privilegiados e longe do mundo do trabalho. Ripley representa o encanto dado à sociedade e à superfície de um mundo das aparências, onde a polidez valia mais do que o mundo da riqueza e da ambição, aqui representada pelo modo de vida arrivista dos americanos.
O Tom Ripley construído por Alain Delon é impecável por dominar tanto a cena quanto o espectador. Temos a impressão que ele manipula tudo com seu charme diabólico e que vislumbra destrinchar até o último momento o seu plano de enriquecimento. Mas o melhor é ver o mundo das aparências sendo demolido pelo mundo real de um cadáver emergindo das profundezas do mar para desmontar o sonho americano de ser Europeu, afinal, O Sol Por Testemunha mostra um Tom Ripley tentando viver seu plano de riqueza pela esperteza. Acredito que ele seja mais um resquício de uma ideia de nobreza feudal falida, avessa ao trabalho, pelo menos o trabalho dela.
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