Texto por Marco Fialho
O grande mérito do diretor Boris Lojkine ao realizar A História de Souleymane pode ser atribuído à capacidade de juntar o cotidiano acelerado do protagonista, um refugiado vindo da Guiné, a uma câmera igualmente dinâmica, disposta a seguir o destino trágico de um personagem e sua luta pela sobrevivência em um país estrangeiro.
A câmera do diretor Boris Lojkine registra com realismo a vida difícil que leva Souleymane (o ótimo Abou Sangare), um jovem que tenta se fixar em solo francês como exilado político, fomentado por um militante de um partido de oposição ao governo da Guiné, que lhe cobra para dar essa "assistência". Souleymane precisa decorar um discurso para replicar numa entrevista que fará no setor de imigração, que decidirá sobre o seu futuro.
Todas as cenas do filme partem da rotina suada de Souleymane, com a câmera quase que a mercê de suas ações. Como refugiado, ele não pode trabalhar com o seu nome, mas aluga a identidade de um camaronês, para trabalhar e pagar a documentação que precisa tirar para residir legalmente na França.
O filme de Boris Lojkine se mostra amplamente cruel, já que Souleymane é tapeado inclusive por todos os supostos colegas africanos que não cansam de dar a volta no rapaz. O que vemos é um verdadeiro mundo cão. A História de Souleymane mostra as dificuldades do trabalho como entregador de aplicativo, uma realidade que muito lembra a do Brasil, onde esses trabalhadores não possuem direitos e são explorados por todos os lados em troca de uma ninharia. Apesar de estar em Paris, aqui não é a Torre Eiffel ou o Louvre as grandes atrações visuais, mas sim a selvageria das ruas, com as suas severas doses de crueldade. Por isso, não é avistada a cidade bonita, ao invés disso, as ruas barulhentas, as pontes, os viadutos e o caos urbano.
O diretor Boris Lojkine é bastante sensível ao abordar as ligações telefônicas de Souleymane com a mãe e a namorada. A primeira sofre com esquizofrenia, já a outra, recebe uma promessa de casamento de um engenheiro em Guiné, e está disposta a ceder ao convite. Assim, somos apresentados à realidade árdua de Souleymane tanto na França quanto em seu país de origem. Entre abrigos governamentais e correria para tentar ganhar algum dinheiro, ele não desanima, por mais que tenha motivos de sobra para isso.
A História de Souleymane mostra uma ótima discussão sobre o universo da globalização, onde grandes empresas se enriquecem enquanto os despossuídos além de pobres, se encontram desamparados e abandonados à própria sorte, cruzando desertos, navios apinhados de refugiados a fugir das guerras e de suas misérias. Esse é um filme onde vemos desnudar o processo de desigualdade e preconceitos contra a população mais necessitada do mundo. É o cinema encarando de frente as idiossincrasias de um sistema onde os indivíduos estão abandonados à própria sorte. E Souleymane é apenas mais um a viver essa triste realidade.
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