Texto por Marco Fialho
Marias, documentário dirigido por Ludmila Curi, busca restituir a importância da participação das mulheres na política, buscando desenvolver no filme uma ideia ampla de política, a partir especialmente da figura de Maria Prestes, que foi casada com o líder comunista Luiz Carlos Prestes e os 7 filhos e filhas que teve com ele. Há algo de ambicioso na proposta da direção de abarcar muito em seus pouco mais de 80 minutos de realização. Considero o primeiro terço um pouco cansativo (não era necessário falar tanto de outras Marias), gosto muito do segundo terço (onde o protagonismo de Maria se firma) e de alguns momentos do terceiro terço (em especial o fechamento, que se preocupa com o universo simbólico da luta política das mulheres, sem esquecer o da mulher Maria Prestes).
O que mais o documentário quer resgatar é a ideia da pluralidade de lutas que muitas vezes não são visíveis nem na mídia em geral nem na política partidária, mas que no cotidiano está presente, e com força. Depois de falar de várias mulheres revolucionárias na história do Brasil, entre elas, Maria Quitéria, Anita Garibaldi (cujo nome de batismo era Maria) e Maria Bonita, a direção dá uma guinada para centrar a narrativa na figura de Maria Prestes, o que faz o documentário alavancar consideravelmente.
Marias frisa, logo de cara, que Maria conheceu Prestes como militante, que portanto tinha consciência política antes de conviver com o líder revolucionário, tendo inclusive chegado até ele pela militância política no PCB (Partido Comunista Brasileiro). Entretanto, jamais vemos o rosto ou a voz de Maria Prestes filmados, o que causa um incômodo imenso a quem assiste ao filme. Ludmila Curi deixa para explicar essa ausência apenas no terço final do filme, quando fala que Maria Prestes não autorizou a exibição de nenhuma imagem dela no documentário. O que achei de uma coragem e de uma consciência política arrebatadora da parte de Ludmila Curi, que não se permitiu desistir, muito pelo contrário, que optou por incorporar a presença de Maria por meio de uma permanente ausência da protagonista.
Dessa forma, o filme acompanhou Maria em diversos debates, onde só assistimos as perguntas e os relatos das pessoas sobre ela. Nas peregrinações que o filme realiza pelo interior do Brasil, ele chega ao acampamento do MST (Movimento dos Sem Terra) chamado de Luiz Carlos Prestes. Maria Prestes é pernambucana e a sua visita no espaço abre uma discussão política interessante sobre o papel das mulheres na política e no cotidiano, assim como o das lutas coletivas, que são um dos pontos e ideias que o filme tenta resgatar.
Mas eis que daqui a pouco estamos na Rússia, numa viagem de exílio de Luiz, Maria e filhos, país onde o casal viveu 9 anos e os filhos tiveram que estudar. Apesar de muito bem registrado e documentado, creio que o filme vai abrindo muitas frentes, que mais atrapalham a fluência do que ajuda. Reunião com Marielle Franco, depois cenas do funeral dela, fora as cenas que se ocupa com o golpe em Dilma, todos esses temas, se por um lado trabalham e fortalecem uma ideia feminina de luta política, por outro, desviam a discussão centrada nessa mulher que o filme quer mostrar e valorizar. Em alguns momentos, me incomodou que a imagem do revolucionário Prestes fica mais em evidência do que a de Maria, mas também é inegável o quanto sua presença na vida pública brasileira e mundial foi marcada por uma grande expressividade política.
A narração em off feito pela própria Ludmila Curi funciona muito para o documentário, por misturar os anseios e a certeza dela em fazer o filme. Exatamente por isso, tem muita ternura permeando todos os momentos do filme. Ludmila diz o quanto Maria Prestes se encantou com a imensa estátua da mãe pátria russa, de 85 metros, e insere Maria numa mitologia iorubá como a guerreira iansã. Ao fim de Marias, me sensibilizei com a visão poética que Ludmila constrói de Maria Prestes, uma mulher que batalhou muito pela causa comunista e criou vários filhos e filhas para o mundo.
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