Texto por Marco Fialho
É bem difícil ver filmes chegarem ao circuito comercial brasileiro, que se passam no interior do Rio Grande do Sul. São histórias pouco conhecidas da maioria do país, o que por si, já deveria atrair a nossa atenção.
Bicho Monstro, de Germano de Oliveira, além desse aspecto territorial, traz uma história ambiciosa em sua dimensão temporal ao misturar duas épocas distintas: uma no século XVIII e da atual, para discutir uma lenda do interior do Rio Grande do Sul, de um imaginário pássaro com cara de roedor (Thiltapes).
A lenda reaparece numa apresentação teatral e impressiona Ana (Kamilly Wagner), uma menina cujo pai desconfiam na comunidade que cegou a vaca do vizinho após perder uma competição para ele da melhor vaca da região. O filme fica indo e vindo no tempo, mas a direção de Germano de Oliveira não consegue criar um vínculo real entre elas, nem fazer com que a lenda tenha uma relevância na história, seja no passado ou no presente.
Um dos pontos que não ajuda o filme a deslanchar é justamente a falta de consistência no roteiro, que não amarra as temporalidades que encampa. A parte do século XVIII em especial é bem pouco interessante, na medida que o explorador estrangeiro, tratado na história como botânico, não apresenta credenciais suficientes como um pesquisador. É bom lembrarmos que à essa época muitos viajantes estrangeiros passaram pelo Brasil, inclusive pelas bandas do Rio Grande do Sul fazendo pesquisas sobre a fauna e flora do local, e foram cruciais na taxonomia botânica e zoológica.
Outra fragilidade que Bicho Monstro apresenta é na direção de atores e essa é uma questão que abarca todas as interpretações. Há uma certa ingenuidade que está no roteiro, mas que aparece nas atuações dos atores, o que faz o filme soar às vezes como um filme voltado à infância, o que não parece ser a intenção da direção é trabalhar os demônios existentes entre o passado e o futuro. As partes de silêncio são mais bem urdidas do que as apoiadas nos diálogos, mas a direção não a explora tanto quanto deveria, como tão bem faz os filmes de Davi Pretto (especialmente Rifle - 2016).
Bicho Monstro se apoia numa estrutura dramatúrgica muito espelhada no realismo fantástico, mas esse fato não é tão estranho à cultura artística gaúcha. Esse lado da fantasia misturada com realidade, em especial para valorizar o universo mágico das crianças é bem recorrente em várias obras. O grande problema não está na parte mágica, mas sim quando se reflete o realismo que está incorporada à obra. Ele não se sustenta porque não há uma concretude que segure a mágica que está inserida na proposta de realismo.
O conflito central de Bicho Monstro é a de um homem que pode ter ferido uma vaca do vizinho, isto é, um dado muito frágil que não chega a despertar um grande interesse do espectador. O que a colonização tem a ver com isso? Quais os grandes conflitos oferecidos a partir daí? Seria o tal pássaro monstro o responsável pelos eventos de agressão? E na cena final temos enfim a resposta, e ela apenas favorece o lado lúdico da história, deixando de fora o tal do realismo.
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