Texto de Marco Fialho
Entrevista Com o Demônio certamente vai figurar em várias listas como o melhor terror do ano. E tem lá os seus méritos para isso, embora, ao meu ver, o filme tenha um desfecho bem decepcionante, por perder toda a potência construída até então. É bom que se diga, que Entrevista Com o Demônio não se trata de um terror convencional, quase todas as cenas se passam em um estúdio de TV, o que é algo raro no gênero.
Os diretores Cameron e Colin Cairnes conseguem criar uma introdução bastante instigante para o filme, quando vemos um tipo de narração jornalística de TV sobre os anos 1970, que termina por dizer que a TV era a maior divulgadora do caos que eram os Estados Unidos da época. Jack Delroy (David Dastmalchian), um apresentador típico dessa atmosfera tomada pelas guerras do Vietnã, da psicodelia e pelas seitas que flertavam com a ideia de demônio. Inclusive o próprio Jack também envolvido com esses grupos mais soturnos.
Se a princípio, o programa Night Owls tinha um perfil mais cômico e sensacionalista, esse esquema vai caindo aos poucos no ralo da audiência. Até que em um programa especial de Halloween a trama tem uma reviravolta mais sinistra e voltada a possíveis charlatões de última hora. June Ross-Mitchel (Laura Gordon), uma paranormal, e Lilly (com uma interpretação de Ingrid Torelli de arrepiar), uma menina com dotes malignos, desafiam Carmichael (Ian Bliss), um caçador de falsos videntes e fantasmas, em programas ao vivo. Sem dúvida, esse é o ponto alto de Entrevista Com o Demônio, quando os espíritos malignos se apropriam do programa de TV comandado por Jack Delroy.
Cameron e Colin Cairnes passam então a jogar com as cenas do programa, as mesclando com outras dos intervalos, em que tudo era rediscutido e que dava para se ter uma ideia de como os bastidores desses programas funcionavam. Esses bastidores marcavam os momentos de maior tensão, onde as incertezas sobre a verdade dos fenômenos fantasmagóricos apenas faziam aumentar as dúvidas de todos, inclusive as nossas como espectadores.
Dá para notar o quanto crescia a ideia de espetáculo na TV, com o sensacionalismo ganhando mais corpo e espaço devido à manipulação da audiência. A falta de limite entre a ideia de verdade e mentira delineava o tom dos programas, em especial os realizados ao vivo. Essa tensão estava no bojo dos interesses econômicos e alimentavam o caos que a própria política trazia para o país. Daí vem a minha maior decepção em relação a Entrevista Com o Demônio. Cameron e Colin Cairnes levantam a bola ao ver a própria mídia como a grande representante do demônio, mas falham em não conseguirem cortar a bola que haviam levantado tão bem no início.
Ao crer mais na fábula fantástica do que no aspecto histórico, que tão bem pontuou no início do filme, Cameron e Colin enveredam pela lenda ao invés de desmascarar os chamados demônios que circundavam os meios mediáticos dos anos 1970, tomados pela paranoia e a exaltação do espírito. Ao não mergulhar no caos do faturamento provenientes dos picos de audiência, os diretores esvaziam a sua fábula por acreditar muito nela, além de se perderem em efeitos visuais forçados, desnecessários e espetaculosos. E olha que os diretores tinham personagens demoníacos perfeitos em mãos, amparados em interpretações consistentes das duas atrizes ligadas ao fenômeno paranormal. Uma pena que essa é mais uma história clássica que se resolve convencionalmente pela culpa do protagonista, o que impede uma expansão crítica do filme.
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