Pular para o conteúdo principal

DIVERTIMENTO (2024) Dir. Marie-Castille Mention-Schaar


Texto de Marco Fialho

Divertimento é um filme que trata da relevante temática da inserção da mulher na regência de orquestras na França. Ainda pode ser acrescido que a personagem Zahia (Oulaya Amamra) vem das camadas mais humildes da França, de uma escola de música situada em uma região metropolitana de Paris. O filme parte de uma história verídica, o que torna tudo mais urgente de ser contado.

Se tem algo que se destaca em Divertimento é a agilidade e fluência na qual a história se desenvolve. Tanto a montagem quanto a direção são pontos coerentes e se articulam com muita competência. Outro destaque é o elenco que apesar de numeroso, afinal o filme se passa numa escola, com muitos personagens coadjuvantes participando das cenas. A protagonista, interpretada por Oulaya Amamra, esbanja carisma e desenvoltura ao segurar o papel de Zahia com leveza e determinação. Sua irmã gêmea, Fettouma (Lina El Arabi), violoncelista, serve como um ótimo apoio para discussões, conversas e diversão com Zahia.

A direção de Marie-Castille Mention-Schaar não arrisca nunca, apostando sempre em uma mise-en-scène bem azeitada, decupada com esmero que só uma boa narrativa clássica sabe conceber. Se o filme se ajeita ao som da boa música erudita, a câmera baila entre atrizes e atores, em um jogo cênico funcional a buscar planos comunicativos. A opção por uma câmera leve impede que o filme cai em um esquematismo, mesmo que a construção narrativa não traga grandes novidades ou surpresas.

Divertimento tem imbricações sociais bem interessantes ao promover uma discussão de classes de maneira soft, sem grandes aprofundamentos, mas ao mesmo tempo, sem deixar de marcar posição acerca do recado que quer passar. Aqui temos uma mulher jovem, determinada em se tornar maestra e disposta a enfrentar as piadas classistas dos coleguinhas da escola acostumada a ter apenas alunos e alunas de situação financeira mais confortável. 

O filme de Marie-Castille não perde de vista que o ponto central de sua trama é a carreira de Zahia e o desafio de enfrentar os olhares de reprovação por ela ser maestra. Quando um maestro consagrado vê o talento inato de Zahia para o ofício tudo muda de figura. A direção consegue o grande mérito de segurar, com o devido entusiasmo, o público em seus 110 minutos, mesmo que de antemão já saibamos o fim da história.          

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

CINEFIALHO - 2024 EM 100 FILMES

           C I N E F I A L H O - 2 0 2 4 E M  1 0 0 F I L M E S   Pela primeira vez faço uma lista tão extensa, com 100 filmes. Mas não são 100 filmes aleatórios, o que os une são as salas de cinema. Creio que 2024 tenha sido, dos últimos anos, o mais transformador, por marcar o início de uma reconexão do público (seja lá o que se entende por isso) com o espaço físico do cinema, com o rito (por mais que o celular e as conversas de sala de estar ainda poluam essa retomada) de assistir um filme na tela grande. Apenas um filme da lista (eu amo exceções) não foi exibido no circuito brasileiro de salas de cinema, o de Clint Eastwood ( Jurado Nº 2 ). Até como uma forma de protesto e respeito, me reservei ao direito de pô-lo aqui. Como um diretor com a importância dele, não teve seu filme exibido na tela grande, indo direto para o streaming? Ainda mais que até os streamings hoje já veem a possibilidade positiva de lançar o filme antes no cinema, inclusiv...

AINDA ESTOU AQUI (2024) Dir. Walter Salles

Texto por Marco Fialho Tem filmes que antes de tudo se estabelecem como vetores simbólicos e mais do que falar de uma época, talvez suas forças advenham de um forte diálogo com o tempo presente. Para mim, é o caso de Ainda Estou Aqui , de Walter Salles, representante do Brasil na corrida do Oscar 2025. Há no Brasil de hoje uma energia estranha, vinda de setores que entoam uma espécie de canto do cisne da época mais terrível do Brasil contemporâneo: a do regime ditatorial civil e militar (1964-85). Esse é o diálogo que Walter estabelece ao trazer para o cinema uma sensível história baseada no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva. Logo na primeira cena Walter Salles mostra ao que veio. A personagem Eunice (Fernanda Torres) está no mar, bem longe da costa, nadando e relaxando, como aparece também em outras cenas do filme. Mas como um prenúncio, sua paz é perturbada pelo som desconfortável de um helicóptero do exército, que rasga o céu do Leblon em um vôo rasante e ameaçador pela praia. ...

BANDIDA: A NÚMERO UM

Texto de Marco Fialho Logo que inicia o filme Bandida: A Número Um , a primeira impressão que tive foi a de que vinha mais um "favela movie " para conta do cinema brasileiro. Mas depois de transcorrido mais de uma hora de filme, a sensação continuou a mesma. Sim, Bandida: A Número Um é desnecessariamente mais uma obra defasada realizada na terceira década do Século XXI, um filme com cara de vinte anos atrás, e não precisava, pois a história em si poderia ter buscado caminhos narrativos mais criativos e originais, afinal, não é todo dia que temos à disposição um roteiro calcado na história de uma mulher poderosa no mundo do crime.     O diretor João Wainer realiza seu filme a partir do livro A Número Um, de Raquel de Oliveira, em que a autora narra a sua própria história como a primeira dama do tráfico no Morro do Vidigal. A ex-BBB Maria Bomani interpreta muito bem essa mulher forte que conseguiu se impor com inteligência e força perante uma conjuntura do crime inteir...