Texto de Marco Fialho
Pode-se dizer que Meu Sangue Ferve Por Você, dirigido por Paulo Machline (Trinta e O Filho Eterno), nos pontos que acerta, acerta muito, e nos pontos que se equivoca, equivoca igualmente muito. No todo, é um filme agradável de assistir, humilde em sua proposta narrativa e bem delimitado no que quer contar acerca da vida do cantor Sidney Magal. A trama toda se restringe ao início turbulento do romance entre Magal (Filipe Bragança) e Magali (até hoje sua esposa), interpretada pela atriz Giovana Cordeiro. Essa história envolveu diversos conflitos familiares e se passou toda em Salvador, capital da Bahia.
Meu Sangue Ferve Por Você não perde muito tempo em enrolações, vai sempre ao ponto que interessa da história e consegue equilibrar bem música, dança e romance. Em relação a carreira em si, o filme se prende mais na relação entre Magal e Jean-Pierre (um Caco Ciocler realmente impecável), seu empresário, que fazia de tudo para que o cantor se mantivesse na crista da onda, nem que para isso se utilizasse de recursos escusos. É interessante a interferência de Jean nos ensaios, inclusive como esses momentos abrilhantam o filme. Os números musicais são até bem passáveis, mesmo que não cause nenhum arrepio maior. E o que dizer da direção de arte, que consegue na sua pesquisa e realização chamar a atenção para muitos detalhes de figurinos (alguns impressionantes) e penteados bem acabados, embora a fotografia enclausure por demais os personagens em uma embalagem asséptica e cromaticamente calculada em demasia. Um pouco de ousadia aqui faria bem.
Alguns atores, particularmente, abrilhantam as cenas, caso de Emanuelle Araújo como a mãe de Magali e de Sidney Santiago, como um tio transgressor, que de dia era Renan e à noite se transformava em uma exuberante drag queen, chamada Rosa Pink. Na verdade, o elenco é um dos pontos complicados de Meu Sangue Ferve Por Você, em especial pela irregularidade apresentada na escolha do casting. Me ficou a impressão, que o elenco de apoio se sai melhor do que os protagonistas. A escolha de Filipe Bragança realmente não foi uma feliz ideia, pois apesar do ator ser goiano, sua fisionomia lembra muito a dos playboys cariocas e não aquela sensualidade selvagem que tinha Magal. Tudo em Filipe é muito convencional, inclusive a beleza, e por mais que ele tenha se dedicado muito, ele não casa com o toque exótico e cigano do Magal original. E outra coisa, um fato que joga contra o filme é ver Filipe cantar as músicas, por mais que ele seja realmente um bom cantor, os trejeitos vocais típicos de Magal não se sustentam com ele, soam sempre artificiais. Não custava manter a voz original, a trama cresceria muito.
Já Magali me dividiu, fiquei oscilando entre gostar e não gostar, muito embora o talento de Giovana Cordeiro sempre aparecia nos momentos mais importantes do filme. A beleza brejeira dela combinou com a Magali original, apesar dela ganhar o concurso da mais bela baiana vestindo uma calça jeans, isso ficou forçado demais. Creio que algumas cenas dela soaram estranhas mais pelo roteiro que não conseguiu em algumas cenas fazer alguma coerência, penso aqui em cenas com o ex-namorado Claudinho, que quase sempre não funcionaram a contento. Nota-se que o roteiro acelera a trama em alguns momentos, o que mecaniza partes do filme, que o faz engasgar tal um motor cujo combustível está prestes a acabar.
Entretanto, o maior trunfo de Meu Sangue Ferve Por Você é não cair na armadilha fácil e patética de todas as cinebiografias de artistas, em que se ousa sempre contar a vida toda do astro, cronologicamente, até a exaustão. A propensão a se falar de tudo e dizer quase nada é o que sempre vigora.
A opção por restringir a vida de Magal ao seu relacionamento com Magali, torna o filme coerente do início ao fim. A carreira de Magal se limita ao que ele faz na Bahia, enquanto os momentos em outras cidades ou no Rio de Janeiro, que é a sua cidade natal, se ausentam espertamente do enredo. Quando o Rio de Janeiro entra na história, adentra com uma visita de uma personagem carioca, isto é, o Rio vai até Magal e isso é bem interessante, pois antes de tudo agrega novos conflitos à trama.
De uma maneira geral, se Meu Sangue Ferve Por Você não chega a entusiasmar, tampouco decepciona, é um filme ideal para se ver, se divertir e depois deixar a borracha do tempo se encarregar de apagá-lo da nossa seletiva e inconstante memória. É um escapismo leve e suave, do tipo Revista Carinho em uma edição especial.
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