Texto de Marco Fialho
O primeiro ponto que gostaria de ressaltar em Rivais é o quanto o diretor Luca Guadagnino se revela um grande artesão cinematográfico. Creio que o forte do filme seja a direção, a construção dos planos, a câmera e a concepção narrativa consciente que Luca faz quando executa uma cena. Isso independe se o resultado me satisfaz ou não, é apenas um reconhecimento honesto de uma habilidade.
Para mim, foi difícil pensar Rivais fora de uma ideia de produto. Isto porque há um acabamento impressionante, um cuidado delicado com cada cena. Rivais não deixa de ser um produto bem embalado, como um comercial de TV bem produzido, apelativo e feito com o propósito de provocar sensações variadas. É um filme típico da atual indústria cinematográfica: caprichar no invólucro para que não se pense tanto no conteúdo.
Creio que um dos elementos mais charmosos de Rivais seja a sua câmera, a valorização da estética do movimento. Encantar pelo olhar, pelo cuidado publicitário que cada imagem evoca. O que Luca Guadagnino faz é um jogo de sedução com o espectador. Ouvi muitos comentários sobre o poder de sedução de Tashi Donaldson (a maravilhosa Zendaya, que muito lembra a nossa carismática atriz/cantora/sanfoneira Lucy Alves), mas o maior encantador de serpentes é o próprio Guadagnino. Se no tênis uma das jogadas mais perfeitas e executadas é a combinação saque/voleio, o diretor faz o mesmo com a combinação câmeras lentas/câmeras aceleradas, em um artifício narrativo deveras envolvente.
Mas o seria de Rivais sem a sua trilha potente, mais publicitária do que nunca, prestes a vender tudo, em especial os corpos dos três protagonistas do filme. O melhor da trilha musical é a parte original, composta pela dupla Trent Rezno e Atticus Ross, em especial os tecnodiscos que embalam o ritmo de Rivais. As trilhas musicais não originais, que inclui David Bowie, Air, Spoon, Donna Summer, entre outros, já não funciona tão bem, soam às vezes forçadas. A exceção fica para a música Pecado, cantada por Caetano Veloso (retirada do disco Fina Estampa) que conduz uma das cenas mais bonitas e uma das poucas intimistas de Rivais.
Outro elemento estrutural que vale mencionar e discutir em Rivais é a sua montagem. O que vemos é uma constante reordenação do tempo, que a cada momento se encaminha para uma época específica, variando pelo menos em duas décadas. O filme parte de um acontecimento perto do que será o final da história e vai pari passu retornando no tempo para esmiuçar detalhes do passado que vão costurando as interrogações do presente. Inicialmente, só sabemos que Tashi e Art Donaldson (Mike Faist) são um casal e que Art é um super campeão do tênis, embora esteja passando por problemas de autoconfiança, depois de uma contusão. Tashi é uma ex-jogadora e a atual treinadora. O que Guadagnino realiza é ir montando o quebra-cabeça que levou cada um a seu lugar e situação atuais. Ambos estão em Atlanta para disputar um Challenger, que é um tipo de torneio com premiação mais baixa, mas que pode fazer a confiança de Art voltar, para que ele possa depois tentar novamente maiores desafios. No meio do caminho tem Patrick Zweig (Josh O'Connor, o mesmo protagonista de La Chimera), um nome desimportante do tênis, porém bastante conhecido pelo casal. A partir daí, vários flashbacks serão acionados de modo a trazer novas informações à trama.
O filme de Luca Guadagnino conduz o espectador pela mão, e vai lentamente apresentando uma trama sensual que envolve o passado dos três protagonistas. Nessa aposta sedutora, o diretor vai abusando em mostrar os corpos dos três em insistentes cenas de nus masculinos em contraposição a uma Zendaya mais comportada na vestimenta, apesar da cena super sexy filmada com ela jogando (trucidando, na verdade) com as adversárias na época do juvenil. Guadagnino filma o movimento do corpo dela e das saias dançando harmoniosamente numa curta minissaia. Embora o filme não tenha nenhuma cena efetiva de sexo, somente a sugestiona, a tensão sexual entre os três fica oscilando a todo o momento, não só deles com ela, mas também entre os dois meninos. Inclusive, uma das cenas mais sensuais do filme fica a cargo deles.
Entretanto fica a dúvida. As cenas mais sensuais são as de sexo ou as de tênis? O filme de Luca Guadagnino transita nessa estrada constantemente provocadora, afinal, tudo aqui se transforma em sedução. A libido está não só nos personagens, está presente também na maneira como o diretor capta imagens e injeta as músicas. A quadra de tênis mais parece uma pista de festa rave do que um ambiente esportivo, e tem cenas que parecem que do nada alguém vai entrar vendendo uma marca famosa de cerveja ou de energético.
Rivais é sim um produto potente, fácil de ser vendido, em especial para uma juventude ávida por adrenalina e pouco disposta a pensar. Se as pessoas fossem para a academia treinar e tivessem o costume de levar um filme, esse seria Rivais.
Maravilha de resenha.
ResponderExcluirObrigado pelo comentário!!
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