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OSPINA, CALI, COLÔMBIA (2023) Dir. Jorge Carvalho


Texto de Marco Fialho

O cinema do colombiano Luis Ospina é um dos mais importantes da América Latina, apesar de não ser muito divulgado aqui entre nós, a não ser em mostras raríssimas dedicadas especificamente a sua obra. Me lembro que em 2017, a Caixa Cultural trouxe não só os filmes como ainda nos presenteou com a presença do próprio Ospina falando dos filmes e de cinema de uma maneira geral. Hoje, o que me restou dessa época foi um catálogo que guardo com carinho dessa bela mostra de 2017.

Ospina, Cali, Colômbia é um documentário que resgata a sua obra visceral, que reconstitui a carreira de Ospina a partir de uma entrevista do diretor Jorge Carvalho com o diretor colombiano, mais uma oportunidade para fomentar o interesse à obra desconhecida de Ospina no Brasil. Hoje, mesmo depois da sua morte, Luis Ospina é o mais destacado nome do cinema colombiano no mundo e o seu cinema ganhou a corruptela Caliwood, que se refere tanto ao baixo orçamento dos seus filmes (e parceiros) quanto sua origem, a cidade de Cali.  

Este é um documentário que se instaura por uma lógica dialógica, em que Ospina vai comentando todos os filmes e fases de sua longa carreira. À entrevista são mescladas imagens dos filmes citados, além de algumas que retratam a história da Colômbia e a passagem de Ospina pelos Estados Unidos como estudante na UCLA. O filme de Jorge Carvalho trabalha basicamente a fala inteligente e instigante de Ospina, que disserta com argúcia tanto sobre cinema quanto sobre a história recente colombiana. 

De maneira ligeira, Ospina comenta sobre o encontro com o cinema, com a revista de crítica Ojo ao Cine e a criação de cineclubes. Rapidamente Ospina passa para o fazer cinematográfico e rapidamente reconhece que ali está a sua forma melhor forma de expressão artística. O documentário de Jorge Carvalho permite que embarquemos pelos pensamentos de Ospina e vai nos encantando com o brilhantismo de suas ideias sobre o papel do cinema no mundo, sendo citando diretores que o influenciaram, como Luis Buñuel e Glauber Rocha. É lindo quando ele diz que o cinema não é só uma janela para o mundo, mas também uma janela para a alma. 

Um dos pontos interessantes do documentário Ospina, Cali, Colômbia é quando ele aborda os parceiros, em especial o cineasta Carlos Mayolo e o jovem crítico Andrés Caycedo, companheiros de luta pelo cinema colombiano. Chama atenção ainda a clareza de cada ideia exposta e como ele amarra sua carreira com a história colombiana, em especial os desvios morais provocados pela política e pela ação do narcotráfico. Fundamental para se entender o cinema de Ospina são as ideias impactantes sobre vampirismo e o "Manifesto da Pornomiséria" (1978), assinado também por Carlos Mayolo.    

Um dos grandes momentos de Ospina, Cali, Colômbia acontece quando ele explica a sua predileção pelo documentário como um instrumento poderoso de comunicação com o mundo. Mesmo que Ospina transborde pessimismo em relação aos rumos do mundo, suas falas são fantásticas por pensarem a partir das ideias do país em que nasceu e morreu.    

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