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TERROR MANDELÃO (2023) Dir. Felipe Larozza e GG Albuquerque


Texto de Marco Fialho

"Terror Mandelão" aborda o trabalho de alguns Dj's que atuam no baile do Helipa, periferia de São Paulo. É interessante como os diretores Felipe Larozza e GG Albuquerque realizam um primeiro longa com muita determinação e cumplicidade aos personagens e ao universo escolhido para retratar. Há uma visível intimidade deles com o tema.

Os diretores imprimem uma estética experimental que muito lembra as texturas e extravagantes das fitas VHS, com cores explosivas e estouradas combinadas com as ranhuras rústicas provenientes desses aparatos anacrônicos. A parte visual é uma das boas apostas do documentário, que chamam a atenção pelos elementos supersaturados. 

"Terror Mandelão" possui uma edição por vezes acelerada demais que evoca programas televisivos dos jovens dos anos 1980. Existe uma concepção de conteúdo que lembra os vídeos de aplicativos do tipo TikTok. Embora os jovens realizadores fujam de uma ideia clássica de documentário, o que é muito bom, acabam caindo em outras armadilhas que esbarram nas narrativas publicitárias e às vezes até de programas de realits shows.      

Outro dado que me incomodou um pouco, foi a decisão de ter muitos personagens, mas ao mesmo tempo enfocar mais em um deles, o DJ K, tornando os outros quase que periféricos na trama. Assim, "Terror Mandelão" avança bem, mas sem nunca pisar efetivamente em nenhum caminho que leve o filme para algum lugar, apenas como um registro bem feito de jovens da periferia. 

Há no título uma insinuação ao terror, apesar de na prática ele praticamente não existir, além de umas máscaras utilizadas em uma performance dançante e fotográfica até interessante. Inclusive, a fotografia é um dos bons atributos desse documentário jovial e sonoramente pensado para ser over. Se "Terror Mandelão" acerta na narrativa ágil que imprime, vacila por priorizar uma estética poluída e por demais volátil, facilmente encontrada nas principais plataformas de streaming. Será que as pessoas ainda não perceberam que as grandes plataformas de conteúdo fazem parte do mainstream?   

As imagens do filme são por demais manipulada, tal como os funks retratados, sempre realizados por meio de efeitos eletrônicos criados em computadores. O filme me soou estranho na sua pretensão independente que não se esquiva de usar estratégias que buscam o aumento constante de visualizações nas redes sociais. 

Evidente que como primeiro longa, o filme merece uma atenção por ser corajoso no enfrentamento do tema, embora possa pesar sobre ele um excesso de masculinidade e de letras que podem despertar a crítica de grupos feministas por olhar as mulheres na perspectiva da objetificação.         

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