Texto de Marco Fialho
Em um primeiro momento "How to have sex" me incomodou pela movimentação excessiva da câmera e o ritmo adolescente que a diretora Molly Manning Walker propõe como narrativa. Uma câmera frenética no início acompanha as três amigas que estão dispostas a tudo para curtir umas férias para lá de ousada. Mas confesso que depois de um tempo fui até me deixando levar pelo seu entusiasmo vazio de ver os rompantes juvenis a flor da pele, mas confesso que a proposta da direção me convenceu mais quando o filme começou a ir para um outro caminho ao centrar mais a trama em Tara (Mia McKenna-Bruce), a jovem deslumbrada que tem apenas como meta perder a virgindade o mais rápido possível.
O que era um filme típico de adolescente, se transforma cena a cena em uma reflexão sobre o abuso e o estupro sofrido por Tara nas suas aventuras pelo mundo da diversão e do sexo. Essa decisão de Molly M. Walker faz as outras duas colegas de viagem tornarem-se imediatamente coadjuvantes na história e permite que o protagonismo de Tara cresça na tela. As opções de enquadramento ajudam a diretora a livrar seu filme da banalidade ao assumir o enfoque narrativo em Tara. A câmera se aproxima dela, e como espectadores, nos tornamos cúmplices dos seus sentimentos e do seu drama, pois o que a câmera faz é agir como se quisesse sufoca-la contra a parede, a asfixiando.
Dessa maneira, "How to have sex" conseguiu abocanhar o prêmio máximo da mostra "Um certo olhar" no Festival de Cannes, dedicado a jovens realizadores. O clima vertiginoso do início coloca o espectador no mesmo clima e expectativa das três amigas e ele é fundamental para a nossa imersão nas festas que as protagonistas estão vivenciando e para nos aproximar em especial das experiências de Tara nesse contexto de farras, bebidas e paqueras.
Entretanto, a diretora logo após desloca essa sensação de euforia para uma outra energia, para uma vibe mais sinistra. É um efeito parecido com o uso de drogas que leva as pessoas do paraíso ao inferno em poucos instantes e tudo acontece muito rápido. O fato de Tara e amigas beberem até cair e vomitar já é o primeiro indício de que aquela aventura com os rapazes do quarto do lado logo iria naufragar.
Mas "How to have sex" ainda joga habilmente com os impulsos juvenis. Tara acaba sendo seduzida por Paddy (Samuel Bottomley), apesar de desenvolver uma relação mais madura com o sedutor Badger (Shaun Thomas). Se, de repente, Tara sai de uma ausência de relações com o sexo oposto para ter duas possibilidades durante a viagem, isso expressa um pouco as próprias curvas sinuosas da vida e que o próprio filme oferece. Enquanto a relação com Paddy é mais imediatista e carnal, com Badger exige mais tempo, mais diálogo e construção. É muita emoção para administrar em uma mesma férias de verão.
O filme é muito sobre esse duro aprendizado de Tara perante as situações práticas do coração e da carne aflita por novas experiências. As cenas de sexo, inclusive, são todas decepcionantes para Tara, que talvez esperasse algo melhor do que a dor que ela claramente expressa em seu rosto. Outra surpresa que ela não esperava é a de ser violentada em um sexo não consentido e não saber o que fazer nem na hora nem no momento a seguir. É visível o quanto ela fica atordoada e sem prumo para agir de imediato. As férias eram para ser surpreendente, repleta de emoções, embora claramente não contemplasse um abuso seguido de violência sexual.
Ao focar em Tara, a diretora Molly M. Walker consegue transformar alegria em dor em poucos minutos, mostrando o quanto a violência ainda permeia as relações no mundo de hoje, inclusive entre os jovens. Com certeza, esse é um fato que as gerações antecessoras não podem igualmente se gabar de ter vencido (muito pelo contrário). "How to have sex" chama atenção para esse tema e o atualiza para que continuemos atentos às gerações vindouras, já que a atual mostra o quanto as mulheres continuam ainda expostas as situações de violência masculina.
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