Texto de Marco Fialho
O primeiro registro que vale a pena registrar acerca das quase quatro horas de "Menu prazer: Les Troisgois" é que os minutos passam suaves pelos nossos sentidos. O diretor Frederick Wiseman desnuda todo o processo que envolve o trabalho de uma família que está no ramo da alta gastronomia francesa há quase um século.
Frederick Wiseman sai um pouco do método observacional para assumir uma câmera mais próxima dos personagens e realizar uma montagem mais dinâmica que dê conta da agitação que é uma cozinha de um restaurante cuja excelência é um pré-requisito para a sua própria existência. Wiseman, salta por meio da montagem de uma panela a outra, de um preparo a outro, sem titubear, registrando o corre-corre dos cozinheiros.
O documentário é cuidadoso ao refazer os passos diários necessários para o sucesso dosem estudos e práticas em seus empreendimentos da família, os cuidados necessários como a escolha dos diversos fornecedores envolvidos, como vinicultores, os feirantes, criadores de gado, ovelhas, mel e queijos, mostrando o quanto esse mundo vai muito além do restaurante. Cada profissional dessas culturas empenham suas vidas no trabalho, para produzirem produtos de alta qualidade, capazes de serem absorvidos por um restaurante do nível da família Les Troisgois.
Entre restaurantes e hotéis, a família Les Troisgois se divide em negócios que vão de La Côte de Roanne até La Colline du Columbier, que envolvem também o ramo hoteleiro. Tudo parece soar como apenas um negócio, mas Wiseman, sem mais nem menos, registra habilmente uma recepção para recolher fundos para ajudar a Ucrânia na guerra. O apolítico que transita durante horas por aquelas boas almas trabalhadoras, de repente descamba para a política. Tudo é muito sutil, porém está ali, fotografado pelas câmeras atentas de Wiseman.
Mas o filme continua na maior parte do tempo mostrando o cotidiano dos restaurantes, das discussões entre pai e filhos sobre os pratos a serem desenvolvidos, assim como ensinam pacientemente aos chefes de cozinha os detalhes de cada prato. O mais impressionante é como os restaurantes funcionam por agendamento, com um cardápio que é adaptado para cada cliente, cuidadosamente pensado para eles. Wiseman mostra o quanto difícil é montar cada prato, que desafie os sentidos gustativos dos clientes, mas dentro de um limite que permita o prazer e uma experiência única.
"Menu prazer: Les Troisgois" garante umas tiradas muito boas como "culinária não é cinema, é realidade", ou então uma frase posta na porta de uma adega: "vinho: uma espécie de podridão nobre". O filme assim caminha, despertando prazer e curiosidade em nós espectadores. E Wiseman, por sua vez, abre mão dos seus longos planos-sequências para nos ofertar um filme tão delicioso quanto os pratos que filmou durante as quase quatro horas de projeção.
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