Keaton merecia mais
Texto de Marco Fialho
Peter Bogdanovich ficou conhecido por diversas obras de ficção, algumas sensacionais como "A última sessão de cinema (1971), "No tempo do cinema" (1976), Lua de papel" (1973) e "Essa pequena é uma parada" (1972), reparem que citei obras dos anos 1970, tempo áureo da chamada Nova Hollywood, movimento que revolucionou a maior indústria do cinema por meio de propostas narrativas inusitadas e criativas, na qual o diretor esteve frontalmente engajado. Mas paralelamente à carreira de diretor de ficções, Bogdanovich realizou pesquisas e estudos sobre a história do cinema e seus trabalhos nesse campo são igualmente valorizados, em filmes que abordaram diretores como John Ford, Orson Welles e estrelas como Natalie Wood.
Portanto a realização do documentário "O grande Buster Keaton: uma celebração", sobre o excepcional ator e diretor que começou a carreira lá no chamado cinema mudo, não chega a ser uma surpresa. A importância de Keaton para a história do cinema é inquestionável, mas é lógico que quanto mais estudos são feitos mais essa relevância é reconhecida, aprofundada e consolidada para as futuras gerações. O filme de Bogdanovich só vem ampliar essa ideia de trazer à baila o caráter e o trabalho de Keaton, de realçar um pouco também a personalidade do cineasta fora das telas e ainda como chegou nas artes.
"O grande Buster Keaton: uma celebração" falha em algumas premissas. O filme, estruturalmente, trilha um caminho bem comum nos documentários biográficos, o de ir construindo as etapas da vida pessoal e artística do personagem Keaton. Sendo assim, inicia com sua infância, depois com os primeiros passos nas artes, a carreira, os casamentos até a sua morte. Porém, depois de seguir essa cronologia, Bogdanovich retoma novamente aos filmes, ou os considerados principais, para então encerrar o documentário. A pergunta que me ficou foi a seguinte: por quê retornar aos filmes ao invés de inserir essa análise dentro da cronologia? Faz sentido seguir uma cronologia para ao final fugir dela e voltar aos filmes? Sente-se nesse desenho narrativo proposto por Bogdanovich uma quebra, como se o filme estivesse recomeçando do zero.
Evidente que apesar desse desequilíbrio no processo narrativo do filme, há uma pesquisa de imagens muito valiosa, não só em relação aos filmes de Keaton quanto dos primórdios da carreira, já que o diretor nasceu em uma família de artistas e essa experiência de berço muito contribuiu na inserção de Keaton na carreira de ator e depois no próprio cinema como diretor e dono de estúdio. É muito bem realizada a parte em que aborda a passagem do cinema mudo para o falado e a difícil adaptação de Keaton a essa nova maneira de produzir filmes. Outra parte interessante trazida por Bogdanovich são alguns materiais expressivos reunidos, como o encontro de Keaton com Chaplin, os detalhes das inúmeras cenas ousadas e de difícil realização empreendidas por Keaton. Talvez Bogdanovich abuse um pouco do uso de muitos depoimentos de ex-colegas de profissão, que contam casos e situações que ocorreram durante as filmagens.
Do ponto de vista narrativo, pode-se inserir "O grande Buster Keaton: uma celebração" como um documentário padrão, ao estilo de tantos outros que são exibidos nos canais a cabo, que tentam dar conta da vida, arte, obras e relações humanas do artista retratado. Por causa desse formato mais convencional, o filme não chega a entusiasmar, como a princípio era esperado, ainda mais por ser dirigido por um diretor do calibre de Peter Bogdanovich, embora possa funcionar como uma obra de aproximação do público mais jovem ao artista genial que foi Buster Keaton. Talvez o próprio título já dava o tom do filme ao grifar as palavras grande e celebração. O enaltecimento está visivelmente amaranhado à proposta de Bogdanovich, o que poderia ser uma grande reflexão sobre o cinema de uma determinada época, torna-se mais um compilado de fatos e notícias sobre um artista que tanto contribuiu para o cinema.
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