O cinema de Halder Gomes sempre me incomodou pela maneira como construiu a inserção da cultura popular nas suas narrativas, reforçando a ideia caricatural de um povo para o qual tudo sempre acaba em uma grande brincadeira ou uma paródia sem criatividade. Felizmente, outras abordagens do popular foram construídas nos últimos anos em nosso cinema, mais críticas à sociedade, como "Auto da Compadecida", de Guel Arraes, numa inspirada adaptação da peça homônima do genial Ariano Suassuna.
Em "Vermelho Monet", seu mais recente trabalho, Halder descamba para uma superprodução internacional, um drama, mas o incômodo em relação a sua obra persiste. Agora, as estratégias são literalmente invertidas, o tema em "Vermelho Monet" perpassa uma suposta ideia de alta cultura, onde a música erudita organiza o filme em capítulos (inspirados em andamentos musicais) e em quadros de pintores clássicos. No centro de tudo está a falsificação, e o que mais o filme de Halter me remete é a isso mesmo, a uma série de quadros artificiais em que levam ao nada, pois para além de imagens bem fotografadas, o longo roteiro não leva a muitos lugares.
Se Halder mirou nas artes, no máximo acertou na estética bem acabada das revistas de celebridades, que nada mais fazem do que projetar uma imagem ficcional e falsa do mundo. Chico Diaz faz o seu pior desempenho no cinema, como um falsificador talentoso, preso em uma vida medíocre e degradante. Maria Fernanda Cândido faz o seu habitual papel de uma mulher glamourosa, rica e vazia, uma caricatura do universo farsesco dos grandes leilões de arte.
Mas o maior problema de "Vermelho Monet" é que a trama não emplaca. Se no começo a trama prometia, aos poucos ela vai se tornando enfadonha e nem o romance lésbico entre a especialista em arte e uma atriz chega a salvar ou dar alguma emoção a mais. Outro problema do filme de Halder é a preocupação de construir uma imagem rebuscada, inspirada em consagradas obras da história da pintura, porém sem desenvolver um roteiro à altura desse requinte visual, o que torna essa imagem obsoleta e vazia, um tipo de beleza pela beleza.
"Vermelho Monet" é um típico caso de um filme que tenta se manter de pé pelos aspectos técnicos. Esse fato levanta uma questão delicada e profunda, mas que merece ser discutida com muita atenção, de que a técnica está desvinculada do todo, e até de alguma forma prescinde dele. O que mais ouvimos nesse caso é o seguinte: "mas a fotografia e a direção de arte são boas demais, salvam o filme." Acreditar nisso é o mesmo que dizer que o lindo design de um carro fará ele andar sem um motor.
"Vermelho Monet", mostra o quanto o vermelho pode ser a cor mais fria e o azul está mais gélido do que nunca. É Halder oscilando a sua carreira entre o popular caricato e o mundo luxuoso e enganoso da alta cultura. Uma experiência que fica somente no mundo da pretensão e das ideias a serem construídas, além de mais uma vez ratificar a divisão inócua e defasada entre cultura popular e alta cultura. É, parece que Halder não consegue escapar dos estereótipos. Mas se tomarmos "Vermelho Monet" como referência, somos levados a concluir que Halder ainda se sai melhor nas comédias do que nos dramas.
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