Texto de Marco Fialho
"Campos conquistados" é um documentário de curta-metragem que enfoca a difícil atuação de mulheres como árbitras de futebol no Brasil, os preconceitos históricos de uma profissão e um esporte totalmente dominado pelos homens. O filme trabalha basicamente com depoimentos de árbitras e bandeirinhas que revelam as enormes barreiras que enfrentaram para poder enfrentar o machismo inerente à profissão.
Há ainda alguns documentos pesquisados na imprensa que reforçam as proibições de mulheres no futebol e um cartoon em que mostra uma juíza apitando de minissaia e um jogador não querendo levantar do chão para admirar a "paisagem" de baixo para cima. Sinceramente, não lembro de outro filme a abordar o tema, o que faz de "Campos conquistados" um documentário pioneiro em explorar um tema ainda hoje cercado de polêmicas e machismo estrutural. O próprio filme questiona as sucessivas perguntas feitas em relação à participação de mulheres em uma arena tomada pelos homens.
Um subtema do filme é o julgamento desmedido entre homens e mulheres nos erros das arbitragens em campo de jogo, mostrando casos em que juízas são julgadas com mais severidade do que os juízes e esse tratamento diferenciado mais uma vez escancara o machismo no qual o tema ainda está imerso. "Campos conquistados aborda também o caso de pioneirismo envolvendo a árbitra Léa Campos e Cesarina Rodrigues que durante a ditadura militar foram as primeiras a enfrentar o então machismo explícito para seguir na profissão.
Um depoimento fundamental é de uma socióloga que cita o cientista social Pierre Bourdieu para pensar o quanto no cotidiano o discurso do dominador se torna o discurso do dominado e o quanto se naturaliza algo como verdadeiro no cotidiano, que na verdade é uma construção social na qual está incutida uma violência simbólica contra as mulheres. Para a pesquisadora é o caso da arbitragem, em que se atribui atributos essencialmente masculinos à profissão, quando em verdade esses atributos podem estar em qualquer pessoa, independente do sexo dela, mas é preciso combater o machismo amplamente, inclusive o das mulheres que introjetaram os argumentos construídos pelo patriarcalismo. A ideia do androcentrismo (conceito que torna a humanidade centrada na figura do homem) está profundamente enraizada na sociedade patriarcal, o que podemos relacionar perfeitamente com o caso brasileiro e o cinema precisa ser fundamental para abrir um diálogo sobre o tema.
Sem dúvida, "Campos conquistados" abre uma importante discussão sobre a participação das mulheres no futebol e esse tema merece uma expansão, pois falar das mulheres no futebol ainda é um tema espinhoso cercado de preconceitos, interdições e machismo estrutural. Vale lembrar a polêmica que ocorreu quando a TV Globo escalou duas mulheres para narrar jogos da Copa do Mundo de 2022, o que mostrou o quanto o assunto ainda está engatinhando no país.
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