Performances pictóricas da arte do encontro e do desencontro
Texto de Marco Fialho
"Toda uma noite" (1982) é um dos filmes mais inusitados de Chantal Akerman. A obra aborda de maneira fragmentada diversas situações de relacionamentos numa uma única noite. Mais uma vez, Chantal investe em pouquíssimos diálogos e numa câmera quase sempre fixa. Ela mostra seu interesse em discutir as relações humanas, em especial, as idiossincrasias inerentes a elas. São encontros e muitos desencontros, uma das especialidades de Chantal.
Como a história de "Toda uma noite" é quase um pretexto para que Chantal esparrame sua proposta visual, há uma primazia na interpretação que sublinha as performances dos atores, o que não chega a ser uma novidade, afinal, o corpo nos filmes de Chantal sempre estão em evidência. Em algumas cenas, as performances são mais explícitas, como nas cenas de dança. São corpos angustiados e desesperados, sedentos por amor (ou seria sexo?). Os gestos evocam mais do que dizem, expressam mais do que interpretam, e assim Chantal vai nos conduzindo em sua dança fílmica. Os corpos estão ali para um jogo, mas não um jogo qualquer, eles representam uma ideia, a ideia que perpassa a concepção que Chantal faz do mundo, das relações, a ideia de busca e solidão na contemporaneidade, de desamparo.
"Toda uma noite" se desenha como um filme insólito, que beira o experimental, com um visual rebuscado e que mais uma vez gesta um quadro poético acerca da solidão e da busca humana pelos sentimentos mais profundos, mesmo quando os personagens se percam nas superficialidades do desejo imediato. Chantal realiza uma obra de forte poder plástico e performático, um experimento visual e sonoro permeado pela sensibilidade que as cenas despertam nos espectadores. Se Chantal exagera na quantidade de personagens e dificulta a apreensão e a atenção, ela acerta no conceito imagético e nos seduz implacavelmente à beleza dos movimentos dos corpos e da fotografia, e na dramaturgia calcada na ideia de uma humanidade sedenta por encontros, apesar de quase sempre prevalecer os desencontros. Chantal, como sempre, facilmente se afeiçoa às pequenas tragédias cotidianas, e faz que elas sejam os objetos de seu encantador cinema.
Um dos destaques de "Toda uma noite" é a fotografia exuberante das cenas noturnas, de Caroline Champetier, que cria sombras que recortam personagens, objetos e cenários, em uma mise-en-scéne pictoricamente inspiradora, como se as imagens que nos chegam fossem pintadas à mão. O filme de Chantal tem essa qualidade que beira o artesanal, no sentido de que tudo o que vemos parece ter sido desenhado antes na imaginação da diretora.
Como a história de "Toda uma noite" é quase um pretexto para que Chantal esparrame sua proposta visual, há uma primazia na interpretação que sublinha as performances dos atores, o que não chega a ser uma novidade, afinal, o corpo nos filmes de Chantal sempre estão em evidência. Em algumas cenas, as performances são mais explícitas, como nas cenas de dança. São corpos angustiados e desesperados, sedentos por amor (ou seria sexo?). Os gestos evocam mais do que dizem, expressam mais do que interpretam, e assim Chantal vai nos conduzindo em sua dança fílmica. Os corpos estão ali para um jogo, mas não um jogo qualquer, eles representam uma ideia, a ideia que perpassa a concepção que Chantal faz do mundo, das relações, a ideia de busca e solidão na contemporaneidade, de desamparo.
Como comum em seus filmes, Chantal abusa na utilização de alguns elementos cênicos, como as portas e escadas. Às vezes, os sons de uma pessoa subindo as escadas ecoam pelo extracampo e assim ampliam o poder das imagens e do sensorialismo. Como esse filme caminha nessa estrada das sensações, do despertar delas. Os personagens entram e saem dos ambientes, em casas, hotéis e ruas, perambulam pelo mundo, na maioria das vezes, indecisos e cambiantes. Amantes que amam e desamam, que desejam, mas que também estão confusos em seus sentimentos, que enganam e são enganados. As portas e escadas marcam esse clima típico dos processos de desamor, de chegadas e partidas. Sente-se, em "Toda a noite", a solidão logo ali, presente na esquina. Os olhares podem encantar, mas também serem suspeitos, podem seduzir e podem trair. Em uma sequência belíssima no bar, os olhares desejam o desejo dos outros e Chantal nos induz a ele, nos perspectiva esses olhares. O cinema de Chantal indaga os nossos desejos, incita ao mesmo tempo o voyeurismo e a desilusão.
"Toda uma noite" se desenha como um filme insólito, que beira o experimental, com um visual rebuscado e que mais uma vez gesta um quadro poético acerca da solidão e da busca humana pelos sentimentos mais profundos, mesmo quando os personagens se percam nas superficialidades do desejo imediato. Chantal realiza uma obra de forte poder plástico e performático, um experimento visual e sonoro permeado pela sensibilidade que as cenas despertam nos espectadores. Se Chantal exagera na quantidade de personagens e dificulta a apreensão e a atenção, ela acerta no conceito imagético e nos seduz implacavelmente à beleza dos movimentos dos corpos e da fotografia, e na dramaturgia calcada na ideia de uma humanidade sedenta por encontros, apesar de quase sempre prevalecer os desencontros. Chantal, como sempre, facilmente se afeiçoa às pequenas tragédias cotidianas, e faz que elas sejam os objetos de seu encantador cinema.
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