Conteúdo fundamental com formato esquemático
Texto de Marco Fialho
O documentário "Rio, negro" traz uma temática fundamental para se melhor entender a cultura não só carioca como brasileira, retomando discussões acerca da participação da população preta na história do país. Uma pena que os diretores Fernando Sousa e Gabriel Barbosa tenham sido tão esquemáticos na abordagem do filme. Inúmeras entrevistas que se seguem ininterruptamente obedecem todas a um mesmo padrão tanto no aspecto cinematográfico (iniciando sempre com a voz em off para depois passar para plano-detalhe nas roupas e só depois revelar os rostos dos entrevistados) quanto no cenário, sempre o mesmo (por mais que entendamos que o espaço do museu foi uma opção cultural importante para a narrativa).
Ainda que "Rio, negro" traga depoimentos expressivos sobre o tema, vindo de autoridades e estudiosos da cultura e eles sejam em sua maioria pretos (Helena Theodoro, Tainá de Paula, Vinícius Natal, Haroldo Costa, Eryck Quirino e outros), além de entrevistados brancos consagrados por estudar a temática, como o historiador Luiz Antônio Simas, Leandro Vieira, o formato escolhido exaure o espectador ao trazer algumas repetições ou ainda ao se alongar em demasia em alguns subtemas, como a da revolta da chibata. O filme se perde muitas vezes por tentar analisar não só o aspecto cultural, mas também o peso histórico, social e geográfico da cultura preta. Esse alargamento prejudica um pouco a dinâmica do filme, que fica muito falado e muito disperso, além de esquecer outros olhares importantes para o estudo do tema.
O último terço do filme é o momento mais interessante, quando "Rio, negro" consegue depoimentos mais consistentes e trazer novas abordagens e informações sobre o tema. Só estranhei o fato do filme não abordar as fortes influências vindas dos pretos dos Estados Unidos, no caso, a grande proliferação do funk nos anos 1970 e do Hip Hop a partir dos anos 1990, já que basta analisar minimamente o tema para se verificar o quanto essas manifestações se enraizaram em nossa cultura, a ponto de não poderem mais serem descartadas, o que transparece um certo olhar dogmático em relação ao estudo em questão.
Da mesma forma que "Rio, negro" toca na expansão dos pretos por diversas manifestações artísticas, no teatro (Abdias Nascimento) e na dança, apesar que o cinema fica à deriva (como esquecer do papel revolucionário do grande Zózimo Bulbul para o cinema brasileiro?). Sei que a proposta centrou-se na influência de uma herança diaspórica manifesta dos que vieram diretamente da África, mas fica cada vez mais difícil abordar a cultura preta hoje sem se pensar na cultura Funk e Hip Hop, basta pensar um pouco o que é a favela carioca e como a cultura a perpassa no mundo contemporâneo. Esse é o grande problema quando se quer abarcar um tema tão amplo como o da cultura preta, que se infiltra por diversas bordas de uma cidade que foi e continua sendo muito plural.
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