Sinopse:
O filme aborda a trajetória artística e existencial do ator e diretor de teatro, Ziembinski, que ao denunciar o nazismo com a peça “Genebra” de Bernard Shaw é obrigado a fugir da Polônia. Após sua fuga, chega por acaso, ao Brasil onde se encontra com Nelson Rodrigues e monta Vestido de Noiva (1943), que revoluciona as artes cênicas no país. Narrado em primeira pessoa, a partir de vasto material de arquivo e com participações das atrizes Nathalia Timberg, Camila Amado e Nicette Bruno, o filme recupera performances de Ziembinski no cinema, novelas e teleteatros através de um diálogo cine-teatral. Apelido carinhoso recebido no país que o adotou, "Zimba" celebra a arte e o ideário do primeiro encenador “brasileiro", criador do teatro moderno e inovador da televisão latino-americana.
A história encantadora de um polonês bem brasileiro
Texto de Marco Fialho
Uma das contribuições que o documentário pode dar à humanidade é a de trazer à luz personagens que passaram pela Terra e deixaram expressivos trabalhos, mas que talvez gerações mais novas sequer conheçam, ou quando muito, apenas ouviram falar porque tal nome está a batizar um teatro ou qualquer outro Centro Cultural. É o caso do diretor e ator polonês Zbigniew Ziembinski (1908-1978), que sedimentou a sua carreira artística no Brasil, com presença marcante na televisão, cinema e sobretudo no teatro, do qual dificilmente se consegue contar uma história sem citar o nome desse brilhante artista.
A tarefa de retratar Ziembinski ficou a cargo do cineasta Joel Pizzini que privilegia fazê-lo dando voz ao próprio e seus principais parceiros que narram vários episódios da carreira dele. Um dos méritos de "Zimba" é o de não querer abarcar a vida toda de Ziembinski, escolhendo momentos cruciais que montam um painel qualitativo da sua trajetória artístico-existencial. Outro destaque do filme é a ótima pesquisa de material de arquivo realizada por Antônio Venâncio, que consegue resgatar imagens de Zimba tanto na Polônia quanto no Brasil, em participações históricas no teatro, cinema e televisão.
Apesar de conhecido pelos trabalhos experimentais, Joel Pizzini volta e meia arrisca-se também no documentário, e com resultados exitosos, como em "500 almas" e "Olho nu". Em "Zimba", Pizzini mais uma vez opta por uma montagem que se desvincula da ordenação temporal, embaralhando épocas e nos deixando usufruir das memórias afetivas e artísticas de Zimba em ação como diretor e ator, sempre a demonstrar um talento que salta aos olhos de todos, fora o respeito profundo pelo país que o acolheu quando ainda jovem precisou fugir da fúria de Hitler.
Ziembinski levou a sério o projeto Brasil e estudou a nossa língua como tal perfeccionismo, que mal dava para suspeitar que ele era um estrangeiro. Ele dizia que não tinha como dirigir uma peça sem conhecer com exatidão a língua portuguesa, já que para Zimba o segredo da boa direção era saber dar ênfase, pausa e entonação a cada palavra proferida por um ator ou atriz. Pizzini centra muito sua análise no Ziembinski como diretor, função na qual ele demonstrava um talento ímpar. Foi ele, o primeiro diretor a descobrir e montar as peças de Nelson Rodrigues, que muitos diziam eram de difícil montagem. Zimba mostrou o quanto valoroso era Nelson, o quanto o seu teatro era fascinante e provocador.
Com "Zimba", Joel Pizzini deixa claro o quanto é impossível contar a história do teatro brasileiro sem citar o nome de Ziembinski, pois a base do teatro moderno brasileiro nos anos 1950, o TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), foi o lugar onde ele deixou uma marca indelével. Outra participação importante foi a presença de Zimba na Companhia Vera Cruz de Cinema, na mesma época. Essas experiências levaram o diretor para a televisão onde pode se consagrar primeiro como diretor, depois como ator.
"Zimba" é um desses documentários encantadores, que torcemos para não acabar, que passam como um sopro sobre nossos olhos, bem quando ainda estamos a nos deliciar com as histórias maravilhosas e atuações inspiradas desse artista polonês, que se afeiçoou por nós na mesma medida que nos afeiçoamos por ele. Fez muito pelas nossas artes, contribuiu tanto e com grande qualidade, que precisamos tratá-lo com o devido respeito e carinho, homenageá-lo e lembrá-lo sistematicamente como brasileiro que também foi. E Joel Pizzini assim o fez em "Zimba" ao retratá-lo de maneira tão delicada e apaixonada, salientando o artista com a devida estatura que possui.
Lembro aqui da primeira sequência do filme, onde um personagem, interpretado pelo próprio Ziembinski, finge a própria morte para ver como os outros o tratariam depois dele partir desse mundo. Se, de início, ele fica feliz com as homenagens que lhe fazem, a seguir vê o quanto vai a cada dia caindo mais um pouco no esquecimento. Creio que essa cena muito diz sobre o papel de um documentário como "Zimba", o quanto ele impacta na nossa memória de um artista tão importante, e que foi tão atuante na vida cultural do país. Ao trazer "Zimba" novamente para perto de nós, Joel Pizzini ressuscita a imagem histórica desse magnífico personagem, que muito colaborou para o reconhecimento das artes no Brasil.
Visto em link cedido pela distribuidora do filme, em 21/09/2021.
Cotação: 3 e meio/5
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