Sinopse
Assim que sai da prisão, a prostituta transexual Sin-Dee (Kitana Kiki Rodriguez) descobre através de sua melhor amiga (Mya Taylor) que o namorado Chester (James Ransone) está saindo com outra pessoa, uma mulher cisgênero. Sin-Dee decide encontrar os dois e puni-los pela traição.
Empoderamento Trans a mil por hora
Texto de Marco Fialho
Sean Baker, diretor desse inusitado “Tangerine” vem se destacando por projetos cinematográficos ousados (a exemplo de seu projeto mais recente, o cultuado “Projeto Flórida”), porém necessários. “Tangerine” foi inteiramente filmado a partir de 3 iphones 5S turbinados, isto é, com modificações feitas exclusivamente para a produção do filme, o que já chama atenção para o bastidor dessa obra.
Outra ousadia do filme está no franco protagonismo das personagens transexuais. No filme elas não estão representadas por um ator/atriz cisgênero, as atrizes são elas próprias transexuais. Pode parecer pouco, mas não é. A representatividade nesse caso é expressiva, já que não há o falseamento da imagem e essa verdade é o ponto de partida para que o espectador sinta a fidedignidade do que vê em tela. Há uma força poderosa vinda da projeção, um nítido empoderamento que transborda de cada imagem, como se o retrato delas fosse feito por elas mesmas. A visão de América forjada nesse filme é fundamental ao ampliar a visão convencional e restrita dos WASP (White, anglo-saxon, protestent). Só por esse aspecto, já seria um grande serviço prestado à coletividade. Todavia, e felizmente, seu filme é bem mais do que isso.
Baker mostra que o uso de celulares para captação das imagens não é gratuito ou uma estratégia de marketing. Há um ganho narrativo visível pela mobilidade dada pelo celular-câmera. A captação das imagens, muitas delas feitas pelas ruas e lanchonetes de Los Angeles. O filme tem essa vivacidade, ele traz o frescor das ruas, o inesperado de se filmar em um espaço público, interferindo nele e também sendo por ele modificado.
Na história do filme, a personagem Sin-Dee Rella (uma adaptação às avessas do universo mágico dos contos infantis) uma mulher trans que vive e sobrevive trabalhando como prostituta, depois de passar um mês detida numa penitenciária, volta às ruas e encontra tudo mudado nesse retorno. Ela descobre que seu cafetão e amante a trocou por outra. Essa outra é uma mulher, o que aumenta sua fúria. Ela e a amiga, também trans, Alexandra vão atrás na descoberta dessa mulher misteriosa. O ritmo dessa busca é frenética, assim como as próprias personagens, com muita câmera na mão e uma fotografia com vários momentos de luz estourada, que muito revela sobre a vida e o ambiente em que elas vivem.
No todo, o filme de Baker não se preocupa em criar idolatria nem pretende fazer denúncias, opta por criar uma atmosfera condizente com a vida atribulada pelas quais essas personagens encaram no dia-a-dia. Há uma extensiva criação de uma ambientação de tensão, afinal o abrupto domina tanto as tomadas quanto o movimento da câmera. Câmera essa que mais do que expressar uma linguagem traduz o espírito conturbado das personagens.
Entretanto não podemos esquecer que antes de tudo, o grande mérito de "Tangerine" é por os corpos dessas mulheres trans integralmente no protagonismo: são seus os corpos transgressores em cena. Mas delas também são o modo de falar, o ponto de vista e os movimentos dos corpos. Sem dúvida, há muita política (na acepção máxima que essa palavra tem) em ação. Para todo o agito que o filme impõe é preciso estar preparado para a sua adrenalina, pois as interpretações de Kitana Kiki Rodriguez e Mya Taylor são de tirar o fôlego. Da energia vinda da tela é de pura potência. É muito empoderamento junto de uma vez só! Uma delícia de se ver.
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