Pular para o conteúdo principal

O SOM DO SILÊNCIO - Direção de Darius Mader


Sinopse:

Em Sound of Metal, um jovem bateirista teme por seu futuro quando percebe que está gradualmente ficando surdo. Duas paixões estão em jogo: a música e sua namorada, que é integrante da mesma banda de heavy metal que o rapaz. Essa mudança drástica acarreta em muita tensão e angústia na vida do baterista, atormentado lentamente pelo silêncio.

O tormento do som e do silêncio

Por Marco Fialho

"O som do silêncio" é um desses milhares de filmes onde o título brasileiro não condiz com a precisão do título original, "Sound of metal", que de certa forma até minimiza algo que é importante para o entendimento da obra. A Amazon Prime vem demonstrando que mesmo produzindo quantitativamente menos que a concorrente Netflix, as suas produções originais são mais livres e menos amarradas a esquemas de produção pré-padronizados de narrativa e fotografia.    

O filme foi indicado a 6 estatuetas do Oscar, incluindo melhor filme, ator, montagem e roteiro original. Um dos pontos mais interessantes de "O silêncio do som" é a coerência do roteiro, que mesmo seguindo numa linha convencional, consegue a todo o momento desenvolver uma trama forte que foge insistentemente do óbvio e da banalidade. Isto porque "Sound of metal" foca em ser um filme de personagem, interpretado por Riz Ahmed, em um trabalho preciso, sem exageros ou apatias, na pele do carismático músico Ruben. Ruben é um baterista que trabalha com Lou (Olivia Cook), que vive com ele um duplo de cantora e namorada. Eles moram em um motorhome que serve de base para a realização de shows em lugares os mais variados possíveis, o que garante uma vida emocionante e repleta de alternativas. 

Como esperado, o som tem um papel decisivo no filme, pois será por meio dele que a história é contada. Quando Ruben repentinamente perde a audição, passamos a vivenciar a sua experiência auditiva, em um trabalho sonoro muito bem construído, de forma a ficarmos reféns das sensações do personagem Ruben. O metal contido no título original, se refere tanto ao som que Ruben praticava para sobreviver como para traduzir o som que ele escuta após se arriscar em uma ousada e cara operação para a recuperação da audição. O som metálico que Ruben passa a escutar traduz metaforicamente o que é o ato de viver a vida, com suas perdas e constantes esforços de readaptação. Os incômodos de Ruben são os nossos, pois o diretor Darius Mader nos coloca sempre na perspectiva do baterista. De tanto produzir sons fortes e altos, Ruben passa a ser afetado pelos sons produzidos pelo mundo. 

"O som do silêncio" nos mostra o quanto nosso lugar no mundo é bem mais dinâmico do que imaginamos, tudo pode ter que ser redesenhado a qualquer momento e essa é a graça/desgraça da vida. E aqui, Ruben é apenas um exemplo desse misterioso turbilhão que é viver, quantas peças a vida nos prega sem que estejamos preparados. Quando Ruben ingressa em uma escola onde todos são surdos, tudo parece ser um grande equívoco, mas eis que tudo se encaixa e a adaptação que aparentemente se vislumbrava difícil acontece. Mas será essa a vida que Ruben pensa para ele? Às vezes o mais confortável e ideal pode não ser o que pretendemos e o risco passa a ser uma possibilidade a ser encarada.       

O estreante diretor Darius Mader nos oferece uma saga sensível de Ruben, que precisa se adaptar rapidamente a um mundo hostil para quem possui alguma deficiência. A trama segue até o fim em um estilo novelesco, sem grandes surpresas cinematográficas. O tiro cinematográfico de Darius é curto, embora eficiente e bem dosado dramaticamente, conseguindo habilmente se esquivar do melodrama superficial e piegas, mesmo que no final deixe aquela mensagem de que não podemos na vida tentar voltar a um ponto já vivido para tentar recomeçar. O que foi bruscamente interrompido jamais voltará a ser como foi um dia. 

Se a vida foi impiedosa e cruel com Ruben, o aprendizado virá pra ele tal como se apresenta a todos os outros mortais: acachapante e implacável. A consciência desse fato é ao mesmo tempo aterrador e libertador para Ruben. "O som do silêncio" mostra tudo isso com uma sinceridade e uma simplicidade comoventes, o que é um mérito no cinema de hoje.   

Visto na plataforma da Amazon Prime, no dia 22/03/2021.  

Cotação: 3 e meio/5                                      

Comentários

Postar um comentário

Deixe seu comentário. Quero saber o que você achou do meu texto. Obrigado!

Postagens mais visitadas deste blog

ÁLBUM DE FILMES VISTOS EM 2023 - 340 filmes

DESTAQUES FILMES INTERNACIONAIS 2023 https://cinefialho.blogspot.com/2023/12/destaques-filmes-internacionais-em-2023.html?m=1 DESTAQUES FILMES BRASILEIROS 2023 https://cinefialho.blogspot.com/2023/12/destaques-de-2023-filmes-brasileiros.html?m=1 DESTAQUES DE CURTAS BRASILEIROS 2023 DESTAQUES DE CURTAS BRASILEIROS 2023 (cinefialho.blogspot.com) ESPECIAL FIM DE ANO: 14 VÍDEOS DO BATE-PAPO CINEFIALHO DE 2023: O REINO DE DEUS (2023) Dir. Claudia Sainte-Luce Vídeo:  Marco Fialho (@cinefialho) • Fotos e vídeos do Instagram ______________ GUAPO'Y (2023) Dir. Sofía Paoli Thorne Vídeo:  Marco Fialho (@cinefialho) • Fotos e vídeos do Instagram _____________ AS GRÁVIDAS (2023) Dir. Pedro Wallace Vídeo:  Marco Fialho (@cinefialho) • Fotos e vídeos do Instagram _____________ À SOMBRA DA LUZ (2023) Dir. Isabel Reyes Bustos e Ignacia Merino Bustos Vídeo:  Marco Fialho (@cinefialho) • Fotos e vídeos do Instagram ______________ PONTES NO MAR (2023) Dir. Patricia Ayala Ruiz Vídeo:  Marco Fialho (@ci

GODZILLA - MINUS ONE

Texto de Marco Fialho O maior mérito de "Godzilla - Minus One" está na maneira como o diretor Takeshi Yamazaki conjuga a história narrada com o contexto histórico do Japão pós segunda guerra. O monstro Godzilla é fruto direto do efeito nuclear provocado pela bomba atômica lançada pelos Estados Unidos.  O filme funciona como uma resposta à vergonha japonesa ao difícil processo de reconstrução do país, como algo ainda a ser superado internamente pela população. A partir desse fato, há um hábil manejo no roteiro para que a história funcione a contento, com uma boa fluência narrativa.  Aqui o monstro é revelado desde o início, não havendo nenhuma valorização narrativa, ou mistério, sobre a sua aparição. Mas se repararmos com atenção, "Godzilla - Minus One" é  um filme de monstro, embora se sustente tendo na base um melodrama de dar inveja até aos mais radicais da safra mexicana dos anos 1950. A história parte de Koichi, um piloto kamikaze que se recusa a executar uma or

UMA BELA MANHÃ (2022) Dir. Mia Hansen-Love

Uma jovem mulher e seus percalços numa França decadente Texto de Marco Fialho Como é bom poder assistir a um filme de Mia Hansen-Love, essa jovem cineasta já com uma carreira sólida e profícua, e vendo ela voltar para os filmes com a sua marca indelével: os dramas românticos arranhados pela dureza da vida cotidiana, de um realismo que caminha entre a vontade de viver e sonhar e a difícil realidade de um mundo que impõe doenças e relacionamentos amorosos complicados.  Um dos pontos a destacar em "Uma bela manhã", esse drama intimista e extremamente sensível, são as atuações dos atores, em especial o belíssimo trabalho de Léa Seydoux como Sandra e a arrebatadora interpretação do experiente ator Pascal Greggory como o pai, um professor e intelectual brilhante que sofre de uma doença neurodegenerativa rara, onde perde a noção espacial e a visão. A câmera de Mia não desgruda a câmera de Sandra e mais do que seu olhar sobre as coisas, acompanhamos o comportamento dela perante às ag