
O registro da alteridade no cinema de
Hong Sang-soo - Crítica de Marco Fialho
Em “A Câmera de Claire”, Hong Sang-soo
aborda um de seus temas preferidos, o da metalinguagem, o que inclusive o
próprio título do filme já sugere. O fato do filme se passar em pleno Festival
de Cannes também evidencia sua afeição por essa sua abordagem. Incrível como
esse filme é concebido com uma naturalidade atroz. Tudo parece estar
rigorosamente no seu lugar, até as tragédias cotidianas inesperadas, como a da
demissão da personagem de Kim Min-hee. A personagem Claire (Isabelle Huppert)
revela-se uma típica flâneur, aberta
aos encontros casuais e à alteridade. O diretor consegue fazer tudo soar muito
espontâneo, os diálogos são tão banais que reforçam ainda mais essa concepção
do todo. É claro que a presença do talento de Isabelle Huppert ao lado desse outro
encanto que é Kim Min-hee valoriza por demais o filme. A química entre elas é
fundamental para a fluência da mise-en-scéne de Sang-soo funcione.
Assim como em outras obras de Sang-soo,
nessa também a simplicidade das situações salta aos olhos, assim como a longa cena com uma conversa travada em um bar e as já manjadas aproximações realizadas com o zoom da câmera, outro artifício bem ao feitio do diretor. O cinema dele
se estabelece mesmo numa aparente banalidade, privilegiando o poder das
relações humanas, as mais comuns, as vindas dos encontros corriqueiros e
fortuitos, mas que podem se revelar inesperadamente transformadores.
Todavia, o que parece ser o ponto forte em “A Câmera de Claire” é como o próprio cinema se insere na trama. Por meio de fotos vindas de uma câmera polaroid, Claire impõe uma relação com o outro. O mais importante de seu ato de fotografar é o resultado dessa ação: a foto resultante fica para o fotografado não para a fotógrafa. Mais uma vez, o cinema de Sang-soo cria um diálogo com o espectador, pois o que importa aqui é como uma imagem produzida impacta diretamente no interlocutor. Por isso o cinema de Sang-Soo é tão potente, mesmo quando parece não ser, por nos mostrar que a vida é um processo, um constante construir com um outro, em um aparente improviso. Demonstra que esse poder transformador não está no cinema, mas sim no cineasta, e mais ainda, no sujeito. Com isso ele corrobora que esse impulso pode permear também qualquer outra relação humana.
Visto no Festival do Rio 2017, no
Estação Ipanema 2.
Cotação: 4/5
Cotação: 4/5
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