
A dança da instabilidade
Crítica de Marco Fialho
O segundo longa da jovem diretora Júlia Murat vem reafirmar seu talento já insinuado em "Histórias que só existem quando lembradas". Em "Pendular" podemos dizer que seu voo é mais ousado e impreciso ainda, escolhendo flertar com instabilidades entre narrativo e experimental, entre dança e artes visuais, entre ciúme e possessão, entre sucesso e fracasso, entre equilíbrio e inconstância, entre outras. São muitas incertezas que movem o casal composto por uma bailarina, interpretada com precisão por Raquel Karro, e um escultor, vivido com intensidade por Rodrigo Bolzan, que dividem o protagonismo do filme e o mesmo galpão-ateliê-residência. É nesse espaço-síntese onde praticamente tudo acontece, onde todos os conflitos e paixões são desfrutados como se o casal vivesse numa cápsula.
O segundo longa da jovem diretora Júlia Murat vem reafirmar seu talento já insinuado em "Histórias que só existem quando lembradas". Em "Pendular" podemos dizer que seu voo é mais ousado e impreciso ainda, escolhendo flertar com instabilidades entre narrativo e experimental, entre dança e artes visuais, entre ciúme e possessão, entre sucesso e fracasso, entre equilíbrio e inconstância, entre outras. São muitas incertezas que movem o casal composto por uma bailarina, interpretada com precisão por Raquel Karro, e um escultor, vivido com intensidade por Rodrigo Bolzan, que dividem o protagonismo do filme e o mesmo galpão-ateliê-residência. É nesse espaço-síntese onde praticamente tudo acontece, onde todos os conflitos e paixões são desfrutados como se o casal vivesse numa cápsula.
Logo na primeira cena o filme já mostra ao que veio. Uma fita adesiva divide o espaço em dois, um da dançarina e outro do escultor. Mas há nessa cena um detalhe significativo muito bem explorado pelo ângulo escolhido por Murat. A fita que ali demarca o espaço de cada um não é exatamente reta, ela é imprecisa, visivelmente tortuosa. Essa é a primeira pista que Murat nos informa acerca do que veremos a seguir, afinal em nossas vidas, assim como na dos personagens, pendulamos cotidianamente em busca de um equilíbrio emocional e corporal. No filme, por exemplo, os personagens têm que lidar ainda com os permanentes julgamentos e apontamentos da crítica especializada, lhes cobrando coerência e/ou renovação sem fim, ossos de um ofício árduo, muitas vezes solitário dos que escolheram a arte como modo de vida.
Mas essas tensões externas espraiam-se para suas vidas e precisam ser enfrentadas a cada dia e interferem na própria organização de seus espaços. O externo e o interno habitam em qualquer relação amorosa, mas eles se corporificam também nas relações do casal para fora do casulo, portanto o filme fala de diversas fronteiras, algumas físicas e outras emocionais que esbarramos em nossas vidas e na nossa tentativa de torná-las corpóreas.
Mas essas fronteiras mostram-se em alguns momentos muito fluidas. O que no início parece, ou entoa, como possível, na prática vai se tornando impraticável, não à toa o escultor reinvidica mais espaço, já que suas obras são volumosas e ocupam muito espaço. Para o escultor, o trabalho de sua amada bailarina serve de inspiração, mas para ela o inverso não funciona e logo vem o seu incômodo com a presença constante da equipe dele.
A divisão então proposta pelo casal para o trabalho é interrompida constantemente para ardentes momentos de sexo entre o casal, mas também para aflorar as permanentes tensões entre eles. Trabalho e vida pessoal acabam se misturando mais do que o esperado e desejos são delineados muitas vezes em desacordo, como o de ser pai e o de não ser mãe. Qual seria então a fronteira dos corpos, das decisões que precisam ser tomadas por eles, como a da gravidez que abre um profundo conflito no emocional da bailarina. As dualidades não se esgotam apenas no espaço do galpão e nos corpos que nele transitam, apesar do filme se passar praticamente o tempo todo nessas cápsulas corporais e espaciais.
Murat cria conexões interessantes com a exterioridade. Uma delas é marcada pela sonoridade, milimetricamente construída no extracampo do filme. O som da rua insiste em invadir e povoar aquela cápsula eivada de criatividade e afetividade à flor da pele e aparentemente isolada do mundo. Mas há também na imagem outros indícios de conexões e interações da cápsula com o mundo de fora, como o cabo de aço que funciona como uma obra expandida do escultor, que o arremessa para fora, para as ruas do entorno. Mas claro que esse espaço-cápsula vez por outra é invadido também pelos amigos, em momentos de festas, diversões e uma animada pelada de futebol onde os corpos femininos e masculinos gostosamente se misturam. Até os espaços virtuais entram nessa dança, quando o escultor compartilha, vez por outra, jogos com uma criança ou um adolescente, via internet.
Porém o que mais impressiona em "Pendular" é a sua camada corpórea incontestável. Sabemos o quanto a dança e a escultura são artes táteis. Não casualmente o sexo, a dança e os objetos são matérias que se adensam poderosamente no filme. As coreografias assinadas por Flávia Meireles são exitosas ao elevar os corpos ao seu protagonismo de fato e de direito, afirmando-os como potência, explosão e importante espaço de fala. O interessante é que as coreografias não roubam a cena, nem são meramente ilustrativas, elas são belissimamente incorporadas e assimiladas ao filme, constituem e azeitam seu corpo.
A proposta de câmera, assim como os personagens, oscila e alternam entre movimentos suavemente bailados que acompanham em especial os corpos quando dançam e fazem sexo, mas respondem com a fixidez, a contrapelo, quando os enquadramentos são mais abertos e exploram mais os espaços ou os corpo situados nessa paisagem. A câmera praticamente fica restrita a um único ambiente, o que faz com que o espectador divida com os personagens uma sensação de claustrofobia, ora incômoda ora prazerosa. Mas será por meio de suas artes que as possibilidades de equilíbrio vão se concretizar, mesmo que ele seja provisório e breve quanto uma apresentação de dança em um objeto projetado para afirmar a instabilidade inerente à arte e a própria vida.
Vale ressaltar que no último Festival de Berlim, "Pendular" foi agraciado com um prêmio de melhor filme na mostra Panorama. A ousadia estética da proposta de Júlia Murat deve ser sublinhada ao misturar, cinema, dança, game e escultura numa obra corajosa e extremamente bem-sucedida.
Um filme muito bom é perfeito. Adorei muito e eu quando vi o Blade Runner 2049 elenco automaticamente escrevi nos filmes que deveria ver porque o elenco é realmente de grande qualidade, sobre tudo Ryan Gosling é um dos meus preferidos, por que sempre leva o seu personagem ao nível mais alto da interpretação, seu trabalho é dos melhores, um filme que desde o meu ponto de vista, é um dos melhores projetos.
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